Benfica em Liverpool: sonhar contra todas as probabilidades

Se as hipóteses do Benfica ultrapassar o Liverpool nestes quartos de final da Liga dos Campeões já eram diminutas à partida, depois de perder (1-3) na Luz, na primeira mão, são agora praticamente residuais. Mas, mesmo que tudo pareça favorecer os reds, o futebol já nos ensinou que não há impossíveis.

O monumental favoritismo do Liverpool para a segunda parte da eliminatória com o Benfica é tão natural como foi a vitória dos ingleses em Lisboa, há uma semana.

A verdade é que o Liverpool habita hoje uma outra galáxia futebolística relativamente ao Benfica, ou a qualquer equipa portuguesa, muito por força da crescente assimetria que marca o futebol europeu. Os grandes clubes das principais ligas têm beneficiado de um processo cada vez mais profundo de concentração de poder e riqueza, tornando praticamente delirantes as aspirações de outros clubes serem competitivos na Champions.

Nesse sentido, para um clube como o Benfica, ou de outra qualquer liga que não faça parte das chamadas Big5 (Inglaterra, Espanha, Alemanha, Itália e França), é já um verdadeiro feito chegar aos quartos de final da competição. Por isso mesmo, é injusto não valorizar os desempenhos recentes dos clubes portugueses na Liga dos Campeões: nos últimos oito anos apenas dois representantes de Portugal e o Ajax furaram o monopólio dos clubes das Big5 nos quartos de final da prova. O FC Porto esteve presente nos quartos em 2015, 2019 e 2021, enquanto o Benfica fez o mesmo em 2016 e em 2022.

Uma espécie de competição desleal

Chegando a esta fase, as águias já mais do que cumpriram o seu dever. A partir daqui, tudo o que vier à rede é peixe, principalmente porque os tubarões das Big5 não costumam deixar alimento para mais ninguém. E sejamos claros, tubarões há poucos, mas são gigantes, e o Liverpool é um deles. Tem o valor de mercado do seu plantel estimado (pelo site Transfermarkt) em 900 milhões de euros (o segundo mais rico do planeta, apenas atrás do Manchester City), enquanto o Benfica (266 milhões) tem o plantel menos valioso dos oito quarto-finalistas da Champions. O Liverpool é ainda o terceiro classificado do ranking da UEFA, 23 lugares acima do 26.º do Benfica.

Ainda para mais, a equipa inglesa está a realizar uma época de excecional qualidade. Encontra-se a disputar o título inglês ombro a ombro com o Manchester City, naquela que é a melhor liga do mundo; vai jogar em breve as meias-finais da Taça de Inglaterra e já venceu a Taça da Liga Inglesa. No conjunto da temporada, o Liverpool realizou já 50 encontros, dos quais perdeu apenas três. Marcou um total de 121 golos e sofreu 36, o que demonstra um enorme equilíbrio coletivo, até porque o seu universo competitivo é de exigência máxima, algo que não se pode dizer relativamente à liga portuguesa.

Por seu lado, o Benfica já não vai sair, com certeza, do terceiro lugar do campeonato português (o que obriga à disputa da qualificação para a Liga dos Campeões), tendo sido afastado da Taça de Portugal e falhado a conquista da Taça da Liga. Os encarnados já perderam 10 vezes nos 49 jogos da época, somando 104 golos marcados e 55 sofridos, o que implica uma (sempre negativa) média superior a um golo concedido por jogo. Ou seja, este não é claramente um Benfica de boa cepa, e para fazer frente a este Liverpool seria necessário um Benfica de exceção.

O que sobra ao Benfica

Perante tais argumentos, o panorama dificilmente poderia ser mais negro para os encarnados. Bem, poder podia: se a "regra dos golos fora" em caso de igualdade final na eliminatória não tivesse deixado de se aplicar nas competições da UEFA na presente temporada, o Benfica até poderia vencer em Anfield por 2-0 e seria eliminado na mesma. Assim, pelo menos, um triunfo por esse resultado garante mais 30 minutos de prolongamento.

O que sobra ao Benfica é sonhar. Por exemplo, sonhar com 2006, quando ganhou (exatamente por 2-0) no terreno do Liverpool, que era o campeão europeu em título, então nos oitavos de final da Champions. É um facto que o Benfica já tinha vencido a primeira mão na Luz, por 1-0, e que o Liverpool de 2006 estava longe de ser a máquina de jogar futebol que é este Liverpool de Jurgen Klopp. Igualmente verdade é que nas quatro eliminatórias europeias até hoje disputadas pelos dois clubes, só nessa ocasião o Benfica levou a melhor.

Sobra ao Benfica sonhar e... jogar, pois claro. Porque no futebol já se viram coisas muito mais improváveis acontecerem. Inclusive, ao Liverpool. Como em 2005, quando perdia por 3-0 na final da Champions em Istambul perante um Milan que era muito mais equipa, e acabou por vencer no desempate por penáltis. Ou como em 1989, na última jornada da Liga Inglesa, quando até podia perder por um golo de diferença com o Arsenal para ser campeão nacional, e sofreu o 0-2 ao minuto 90 da partida, apontado por um médio chamado Michael Thomas. Sim, esse mesmo, o Michael Thomas que anos depois se tornaria "patinho feio" de estimação do Estádio da Luz.

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