O jogador dos Los Angels Lakers ultrapassa a marca do lendário Karem Abdul Jabbar, os 38.387 na mais exigente liga de basquetebol do mundo. São 20 anos ao mais alto nível de um jogador que se inspirou em Michael Jordan, mas que encontrou no jogo uma forma diferente de se destacar.
Caiu um dos recordes mais bem guardados do mundo do desporto. Lebron James construiu uma carreira de 20 anos na NBA, onde, para quem o seguiu desde cedo na carreira, o número 38.387, o recorde de pontos de Kareem Abdul Jabar, sempre pareceu algo alcançável. E isso diz muito sobre a figura de um atleta de referência, com uma longevidade entre a elite que permite que, aos 38 anos, duas décadas da mais exigente liga de basquetebol do mundo, seja ainda impossível de prever o ponto final da carreira.
LeBron James tem quatro títulos da NBA, joga numa das equipas com maior história na modalidade, onde há condições para voltar a construir uma equipa ganhadora. LeBron continua na corrida para ser o melhor jogador a cada temporada.
"Quero jogar com o meu filho, ou jogar com ele, com a mesma camisola que ele, ou contra ele", explicou LeBron James no ínicio de 2023, numa entrevista onde falou sobre o percurso, o recorde que já avistava de perto. LeBron Raymone James Jr., conhecido no mundo do basquetebol por "Bronny", carrega o nome do pai, e está entre os atletas que podem chegar à liga já em 2024, após cumprir o primeiro ano como jogador do basquetebol universitário.
Um novo recorde num novo mundo
Em 1984, Kareem Abdul Jabar quebrou com um gancho, o seu lance de assinatura, o que mais confiança lhe dava no ataque ao cesto, o recorde de Wil Chamberlain, outra figura mítica da modalidade, também ele antigo jogador dos Los Angels Lakers. No único canal de televisão que transmitia o jogo anunciava-se: "Este homem conseguiu algo que, acredito, nenhum outro irá alcançar". LeBron James quebra o recorde num outro mundo. Mais de 200 países transmitem os jogos da liga norte-americana diariamente.
LeBron James marcou os primeiros dois pontos na NBA em 2003, no primeiro jogo da temporada pelos Cleveland Cavaliers, no terreno dos Sacramento Kings. Não passou pelo basquetebol universitário porque as regras da NBA ainda permitiam uma travessia do liceu para o basquetebol profissional num único passo.
No dia do jogo com os Kings, a 29 de outubro de 2003, Cristiano Ronaldo somava três jogos pelo Manchester United na primeira temporada em Inglaterra; Roger Federer dominava o ténis; José Mourinho treinava o Futebol Clube do Porto, já vencedor da Taça Uefa. Em Portugal, as transmissões televisivas da NBA limitavam-se a um jogo por dia.
LeBron inspirou-se em Jordan, mas tornou-se um jogador diferente
Nas tabelas de Akron, na região de Cleveland, James queria ser como Jordan. "Eu pensava em Michael Jordan como um deus. Era em quem pensava quando jogava na rua (...) "Eu fiz tudo para ser o Mike. Usei sapatilhas e meias negras, imitava-o. Só queria ser como ele", explicou em 2020 quando ultrapassou o recorde de pontos na fase decisiva da temporada - o playoff, eliminatórias que apuram o campeão da liga -, que era do número 23 dos Chicago Bulls.
Mas LeBron James sempre assumiu que o papel de (único) protagonista não lhe assentava bem.
"Eu sempre me considerei um passador". LeBron James nunca foi o melhor lançador, o melhor ressaltador, o melhor passador, o melhor defesa ou a mais vertiginosa arma ofensiva da liga. Mas sempre fez tudo no jogo das equipas por onde passou, de uma forma que poucos conseguiram alcançar.
Depois de marcar os primeiros pontos na liga, Bibby Jackson, um dos atletas dos Sacramento Kings, admitiu que via em LeBron um jogador agressivo na forma como passava a bola. "A melhor coisa que vejo nele é a forma como distribui a bola. Fá-lo de uma forma quase perfeita".
"Eu só quero jogar da forma certa a cada noite, depois, que as fichas caiam onde têm de cair", explica LeBron James sobre a forma como quer jogar. "O que adoro é colocar os meus companheiros em jogo, deixar a bola disponível para que possam atirar ao cesto. Perceber a velocidade, ver o terreno de jogo e conduzir o passe certo".
Em 2016, Brian Windhorts, repórter da ESPN explicava num artigo que LeBron James se dedicara a tentar tirar o máximo dos companheiros de equipa no regresso a Cleveland (e já depois do primeiro título conquistado com a franquia que começou por representar na NBA, e onde regressou anos depois). Nunca como naquela época - após 14 temporadas e três títulos da NBA -, LeBron James lançou tão pouco ao cesto (média de 17,2 arremessos por temporada).
Windhorts escrevia que James havia decorado as melhores posições, condições de passe que cada um dos companheiros de equipa em Clevland gostava. Passe mais alto, mais baixo, mais rápido, mais distante ou mais próxima da marcação do adversário. A estrela da equipa assumia a responsabilidade. "É meu dever saber como é que cada um dos rapazes quer a bola", explicava LeBron James.
O treinador dos Portland Trail Blazers, Terry Stotts, admitiu no final de um encontro que não sabia como contrariar aquele momento de forma. "É impossível defender aquilo. Se marcas LeBron junto à tabela ele coloca a bola para um canto, para lançamento de três pontos. Por vezes até estamos bem posicionados, mas a forma como coloca a bola para um lançamento longo deixa-nos fora da jogada. Por vezes ficamos apenas a acompanhar os lances com os olhos".
"Se alguém disser: fiz aquele passe extra, aquele bloqueio porque o Lebron também o faria" Isso para mim seria a maior recompensa", explica LeBron James numa entrevista onde, foi questionado sobre o legado que entende deixar no desporto.
Depois de conquistar o primeiro título da carreira, ao serviço dos Miami Heat, LeBron resumia o que o deixava fora de si. Escolhera - com ponta e circunstancia no anuncio, em direito na televisão - trocar os Cleveland Cavaliers da sua cidade natal pelos Miami Heat. "Gritavam que eu era egoísta. Isso foi o que mais me custava ouvir".