Fernando Gomes, antiga glória do futebol português e uma das principais figuras da história do FC Porto, morreu este sábado aos 66 anos. A notícia foi confirmada pelo FC Porto no Twitter.
O céu levou-nos o 9. Os golos ficam na memória de todos.
Até sempre, Bibota. pic.twitter.com/FezNBYUYqj
Fernando Gomes nasceu no dia 22 de novembro de 1956, na cidade do Porto. Gostava de jogar futebol na escola, onde lhe diziam que tinha algum jeito, e acompanhava o pai aos jogos do FC Porto, não só da equipa principal, como das camadas jovens.
Um dia, com 14 anos e durante as férias de verão, acompanhou um amigo, mais velho e com idade para competir, desde Rio Tinto até à Constituição para que ele pudesse ir a um treino de captação no FC Porto. Com receio, entrou no balneário com o amigo e o roupeiro deu-lhe também um equipamento para que pudesse treinar. Assim foi e assim começou a história de um dos maiores nomes da história do futebol português.
Daí a começar a brilhar nos principais palcos do futebol português foi um instante. Começou a ir a treinos da equipa principal e no dia 8 de setembro de 1974, na primeira jornada do Campeonato Nacional da I Divisão, tudo mudou na história do futebol.
Fernando Gomes (1956-2022)
"Marcar golos muitos têm a felicidade de marcar. Marcar no teu clube do coração, a felicidade é maior" pic.twitter.com/XryjvgXroB
A primeira vez que aparece nos treinos da equipa principal, tinha 16 anos e foi chamado por Bélla Guttmann. "No fim, e bem, ele disse que não, que era melhor para mim ter mais um ano na formação", contou o próprio numa entrevista ao Porto Canal em 2017.
Na época seguinte, com apenas 17 anos, Fernando Gomes foi chamado pelo então treinador, Aymoré Moreira, para integrar o plantel principal. "A minha sorte apareceu num jogo de pré-época com o Boavista. O senhor Aymoré Moreira chamou outro jogador para entrar, já com alguma idade, e faltava pouco tempo para acabar. Esse jogador não gostou, fez uma birrazinha e não entrou. O senhor Aymoré Moreira disse: 'Então menino, entre você.' Lá entrei e foi assim a minha oportunidade", recordou o antigo avançado.
Na primeira jornada do campeonato, perante o CUF, o jovem avançado era lançado a titular e marcou os dois golos com que os dragões venceram a partida.
"Eu joguei como um ala ou um ala disfarçado. Quando a equipa defendia, eu, como ala, defendia, e quando a equipa atacava, em diagonal, ia para o meio. O primeiro golo foi uma jogada dessas: numa diagonal, fui mais rápido do que os defesas e marquei. Na segunda parte, foi num canto. A bola sobrou na área e eu rematei", revelou na mesma entrevista. Foram os primeiros dois, dos 355 que marcou de dragão ao peito.
Seguiram-se seis temporadas consecutivas de dragão ao peito onde não faltaram golos e em que se tornou uma das maiores referências não só da equipa portuense, como do futebol português. Os 153 golos em 195 jogos traduziram-se numa Taça de Portugal e dois campeonatos nacionais. Foi nessa altura que surgiram os primeiros jogos e golos a nível internacional. O primeiro acontece frente ao Wolverhampton, no dia 18 de setembro de 1974, quando introduziu a bola na baliza dos britânicos aos 69 minutos.
"Havia de facto quem não nos deixava [ganhar]. Mas também havia erros próprios e faltava mentalidade para que fôssemos vencedores. Havia pouco rigor. Ganhávamos dois jogos e já achávamos que éramos os melhores", considerou, lembrando os primeiros anos, antes de Pinto da Costa e Pedroto chegarem ao leme do clube.
Seguiu-se uma transferência para Espanha que coincidiu com o abandono temporário de Pinto da Costa e de Pedroto aos dragões. O Sporting de Gijón pagou 60 milhões de pesetas ao FC Porto e Fernando Gomes experimentou a liga espanhola.
Logo nos primeiros dias em Espanha, o Gijón defrontou o Oviedo numa partida de pré-temporada e Fernando Gomes foi logo titular e marcou cinco golos na partida. Era um belo início para uma estadia que rapidamente se tornou um pesadelo. Numa partida contra o Athletic Blibau, o avançado marcou um golo, mas no festejo lesionou-se no tendão de Aquiles e foi forçado a uma longa paragem.
Mas o azar de uns, foi a sorte do FC Porto e, embora não parecesse, acabaria por ser a sorte de Fernando Gomes. Pinto da Costa candidatou-se à presidência dos dragões e uma das promessas eleitorais era o regresso do avançado. Depois de 33 jogos e 16 golos em duas temporadas em Espanha, o ídolo portista regressava a casa.
Mas não foi fácil: "Quando se encetaram as negociações e se decidiu que eu ia, Pinto da Costa e Pedroto ainda não estavam no clube (...) Tive que ajudar. Não foi fácil, tive de me chatear com o presidente do Gijón que era meu amigo. Eu disse que não jogava mais se não fosse para o FC Porto e também abdicava do dinheiro."
A época de regresso foi aquela em que a alcunha se começou a formar. Em 39 jogos de dragão ao peito, Gomes marcou 50 golos e ganhou a primeira Bota de Ouro, prémio para o melhor marcador das ligas europeias numa temporada. Fernando era agora o "bota".
Na temporada 1983/1984, os dragões não conseguem vencer o campeonato, mas alcançam a primeira final europeia da história do clube. O FC Porto ultrapassa todos os obstáculos na extinta Taça das Taças e, na final, enfrentaria a Juventus. O golo de António Sousa foi insuficiente para os dragões vencerem, já que Vignola e Boniek deram a vitória aos italianos.
"Nós não fomos completamente para a final como se o único resultado fosse a vitória. Já fomos com uma pequena vitória que foi estar na final. Mas fizemos um jogo fantástico. (...) Tudo fizemos e encostamos a Juventus (...) Fomos melhores, mas não tivemos a capacidade emocional para enfrentar as adversidades", lembrou o antigo jogador.
No ano seguinte a alcunha completa-se. Fernando Gomes marcou 46 golos em 42 jogos em 1984/1985 e venceu a segunda Bota de Ouro. Era, é e continuará a ser o "bibota".
A glória europeia veio três anos depois. Na temporada 1986/1987, o FC Porto chegou à final da Taça dos Clubes Campeões Europeus e enfrentava o poderoso Bayern de Munique. Os dragões acabariam por vencer por 2-1 com o célebre golo de calcanhar de Rabah Madjer e de Juary.
Contudo, foi um sentimento agridoce para o antigo avançado. Fernando Gomes foi fundamental na caminhada, mas uma lesão tirou-o do jogo decisivo.
"Hoje falo com um sorriso nos lábios. Depois disso fiquei bastante desiludido, mas não exteriorizei", disse o "bibota".
A redenção surge logo a seguir, em Tóquio, contra o Peñarol. Fernando Gomes marcou um dos dois golos com que os dragões venceram a Taça Intercontinental. As conquistas internacionais ainda não tinham terminado, já que faltava a conquista da Supertaça Europeia, frente ao Ajax.
O fim de Gomes no FC Porto começa com Ivic como treinador e com a frase do Jugoslavo que ficou na memória de todos os portistas: "Gomes é finito."
A saída do treinador e o ingresso de Quinito, que dizia que o FC Porto era "Gomes e mais dez", parecia trazer de volta a normalidade, mas os maus resultados ditaram a saída do treinador e o regresso do campeão europeu Artur Jorge.
Até que, na véspera de uma partida, Fernando Gomes insurgiu-se contra o facto de os dirigentes do clube serem servidos antes dos jogadores ao jantar e o verniz estalou. Ao fim de mais sete épocas de azul e branco, o casamento tinha chegado ao fim, mas a carreira do avançado não.
Em 1989/1990, Fernando Gomes era anunciado como jogador do Sporting. Gomes, bem ao seu jeito, chega a Lisboa e desata a marcar golos. Foram nove na primeira época e 29 na segunda, onde foi importante para a campanha dos leões na Taça UEFA.
Honrou o Sporting CP durante 2 épocas de ao peito.
Até sempre, Fernando Gomes. pic.twitter.com/mvaejgkuBr
Ao longo da carreira, Fernando Gomes ainda foi internacional português por 48 vezes, nos quais marcou 13 golos. Disputou as fases finais do Euro 1984, em França, e do Mundial 1986, no México.
No total, foi uma carreira de 420 golos marcados em 611 jogos para a história do futebol português.
Depois de terminar a carreira, o "bibota" continuou ligado ao futebol, tendo estado vários anos ligado à estrutura do FC Porto, onde foi chefe do departamento de scouting, entre outros cargos. Atualmente era vogal da direção do clube.