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Fome, má nutrição, a quase inexistência de cuidados de saúde básicos, isolamento. É a descrição é da chefe de missão dos Médicos Sem Fronteiras no Iémen.
Caroline Ducarme diz que os iemenitas estão perdidos. O país vive em guerra desde 2014 e esta semana foi anunciado um cessar-fogo de dois meses em respeito pelo período do Ramadão. A chefe dos Médicos Sem Fronteiras (MSF) no Iémen afirma que as pessoas estão perdidas e pede à comunidade internacional que não se esqueça do país.
Caroline Ducarme fala de um país em que praticamente não existe assistência médica e quase sem alimentos. "Esta situação já dura há demasiado tempo. Infelizmente há falhas enormes no acesso da população a cuidados de saúde nos hospitais e acabam por sofrer complicações graves, porque não têm acesso aos cuidados primários. Chegam já numa condição muito difícil, muito crítica e é complicado salvá-los. Além disso, não conseguem ter acesso à saúde, vêm de muito, muito longe, chegam depois de várias horas a caminhar, a viajar, porque não conseguem um carro, não conseguem pagar transporte para chegar ao hospital. Tem sido muito difícil."
Caroline Ducarme diz que o período do Ramadão agrava ainda mais a falta de alimento, porque os preços não param de aumentar. "De uma forma geral o acesso a comida é sempre um desafio no Iémen e a má nutrição é uma realidade em muitas regiões. O Ramadão agrava os problemas, porque as pessoas estão em jejum, mas o grande problema é o elevado preço dos alimentos, os preços que continuam a aumentar também como consequência da guerra na Ucrânia."
Em março, já com a guerra na Ucrânia, o secretário-geral das Nações Unidas pediu ao mundo que não se esqueça do Iémen. António Guterres sublinhou que esta guerra não faz manchetes, mas o sofrimento humano continua.
Questionada sobre como é possível viver no país em guerra há oito anos, a chefe de missão dos MSF no Iémen diz que é muito difícil. "As pessoas estão perdidas... é uma situação em que a vida continua, mas as pessoas não conseguem aguentar. No dia-a-dia ouvimos histórias muito tristes, a situação é muito difícil no Iémen."
Caroline Ducarme pede à comunidade internacional para que não esqueça o Iémen. "Os cuidados de saúde têm que continuar a contar com a ajuda humanitária. As pessoas precisam de segurança, de alimentação de qualidade e para sobreviver é necessário continuar a apoiar este país. Independentemente do que acontece no resto do mundo, o Iémen precisa e merece atenção."
Projeto Hajjah
Um conflito e problemas que têm também consequências na saúde mental. Desde 2018 que os Médicos Sem Fronteiras têm, no Iémen, o projeto Hajjah, que oferece apoio psicológico a todos os que sentem afetados por viver num país em guerra. Lais Monteiro Vazami é psiquiatra, faz parte da equipa dos MSF que trabalha neste projeto de saúde mental. "Temos desde casos de ansiedade, até psicoses, depressão, bipolaridade, transtorno de stress pós-traumático, mas em Hajjah a psicose é o que mais vemos."
Um projeto multidisciplinar, conta com psicólogos, médicos, um psiquiatra, um enfermeiro, um farmacêutico, um assistente social e uma tradutora, todos iemenitas.
Lais Monteiro Vazami lamenta que a saúde mental ainda seja vista como algo secundário. "Aqui existe uma ausência muito grande de informação sobre o que são estas doenças, temos que dizer às pessoas que podem procurar ajuda. Existe um estigma muito forte relacionado sobre a saúde mental, o acesso à saúde é dificultado."
O projeto Hajjah é totalmente gratuito e foi fundado em 2018.