Espera por mim, Kiev

Varsóvia, Polónia. Quando entrei na Ucrânia pela primeira vez, três dias depois do princípio da guerra, comboios, autocarros, carros particulares, carrinhas e motos, tudo o que tivesse rodas era utilizado para deixar o país em direção à Polónia, à Hungria e à Roménia. Naquele dia, a fila de carros numa das fronteiras tinha 26 quilómetros. Doze dias era o tempo estimado para que a última família da fila conseguisse chegar à fronteira.

Nos primeiros dez dias de guerra, com temperaturas negativas, neve e frio polar, um ucraniano por segundo deixava o país. Foi o êxodo mais rápido de sempre desde que há registos. Mas o fluxo está a mudar.

No dia 86, não há bilhetes de comboio à venda em direção à Ucrânia até ao fim deste mês de Maio. Está tudo cheio. Esgotado. Lotado. Sobrelotado. Em Varsóvia, a capital do país que acolheu a grande maioria dos reguladoras ucranianos, o movimento é, agora, o inverso. Há longas filas de mulheres, crianças e idosos à espera para poderem comprar um bilhete de regresso a casa.

As estações de comboios voltaram a ser um lugar de esperança, mas na partida e não na chegada.

O mesmo nos terminais de autocarros. As plataformas, repletas, e as filas dos que esperam que quem comprou bilhete não apareça, para ocupar os lugares que, por magia, ficaram vazios. E são poucos os que sobram. Todos querem voltar a casa. À Ucrânia.

Lá estão as mesmas malas de há quase três meses, as crianças e os seus brinquedos, os avós amparados por filhos e netos, com cuidado, carinho e paciência.

Há, nestes rostos, um misto de preocupação e esperança. Os que agora regressam vão com a ideia de que será seguro voltar. Mas, em muitos casos, sem saber o que vão encontrar nos lugares onde suspenderam as vidas a 24 de fevereiro.

Talvez Putin não contasse com isto. Talvez tivesse pensado que em duas semanas chegaria a Kiev e tivesse um país inteiro a seus pés. Talvez lhe tenham dito que era fácil, rápido e quase indolor.

Enganou se.

A mulher que procura um dos lugares comprados e não reclamados esteve todo este tempo na Suécia. Hoje regressa, com a filha. Não volta à cidade natal, porque está ocupada. Mas volta ao país, regressa ao solo ucraniano.

- Porquê?, pergunto

- Porque a Ucrânia é a minha casa.

Espera por eles, Kiev.

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