Ecstasy aliado a terapia pode ajudar a combater stress pós-traumático

Cientistas descobriram que droga pode contribuir para eliminar o stress pós-traumático. Estudo envolveu militares que combateram em guerra e sobreviventes de violência.

Um novo estudo, que deverá ser publicado este mês na revista médica Nature Medicine, concluiu que os pacientes que tomaram metilenodioximetanfetamina (MDMA) - que popularmente conhecemos como "ecstasy" - durante o processo de acompanhamento psicológico mostram uma redução maior dos sintomas de stress pós-traumático do que aqueles cuja terapia não foi acompanhada por esta substância.

O jornal The New York Times revela que a investigação contou com a participação de 90 pessoas, entre as quais veteranos de guerra, vítimas de violência doméstica ou sexual e sobreviventes de ataques terroristas, que sofriam de stress pós-traumático há vários anos, muitas das quais com historiais de abuso de álcool e outras substâncias e com pensamentos suicidas.

Dois meses após o início do tratamento, 67% dos participantes do grupo que tomou MDMA já não tinha stress pós-traumático, enquanto no grupo que não tomou apenas 32% tinham superado os sintomas.

O estudo indica que a MDMA não terá produzido graves efeitos secundários, com apenas alguns participantes a relatarem terem sofrido náuseas e perda de apetite

Citada pelo The New York Times, Jennifer Mitchell, neurocientista da Universidade da Califórnia, em São Francisco, e uma das responsáveis pelo estudo, afirma que a MDMA permite ao cérebro processar as memórias dolorosas e autopreservar-se.

A substância trabalha com as proteínas que regulam a serotonina, o neurotransmissor que, entre outras funções, regula o humor. No entanto, de acordo com os especialistas, o benefício principal da droga é a capacidade que esta tem de abrir a "janela" do "período crítico" em que o cérebro tem maior capacidade para criar e organizar novas memórias.

O tratamento só funciona, no entanto, com o acompanhamento psicológico. A toma de MDMA sem terapia não produz automaticamente efeitos benéficos, ressalva a cientista.

Para que a terapia assistida por MDMA possa ser aprovada, terá ainda de passar por mais uma fase de testes da Food and Drug Administration (FDA), agência federal do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos. Esses testes já começaram, estão a ser conduzidos numa centena de pessoas e, se os resultados se confirmarem positivos, o tratamento com MDMA poderá ser aprovado já em 2023.

Os especialistas afirmam que esta nova fase de testes pode abrir caminho para mais estudos sobre o potencial da MDMA no tratamento de doenças mentais, tais como o abuso de substâncias, distúrbios obsessivo-compulsivos, fobias, distúrbios alimentares, depressão e ansiedade

O estudo pode também levar a uma maior abertura para investigações que recorram a outras substâncias psicadélicas, como LSD, psilocibina e mescalina.

"Este é um tempo maravilhoso para a descoberta porque as pessoas estão dispostas a considerar estas substâncias como terapêuticas de novo, algo que já não acontecia há 50 anos", afirmou Jennifer Mitchell, ao The New York Times.

No entanto, há especialistas que pedem maior coibição no uso deste tipo de drogas para uso terapêutico, alegando que estes novos tratamentos podem parecer mais promissores do que o são na realidade.

A MDMA foi inventada em 1912, tendo ficado esquecida até à década de 1970, quando o químico Alexander Shulgin decidiu experimentá-la em si próprio. Ao perceber que a substância poderia ter efeitos terapêuticos, partilhou-a com o psicoterapeuta Leo Zeff, que apresentou a droga a outros especialistas da saúde mental. A partir daí, centenas de terapeutas passaram a administrar milhares de doses de MDMA, registando progressos rápidos na recuperação dos pacientes. No entanto, na década de 1980, a droga passou a ser usada para fins recreativos - ganhando o nome pelo qual a conhecemos popularmente, ecstasy - e esta acabou por ser criminalizada por ter "um alto potencial para abuso", deixando de ser também aceite o seu uso para fins medicinais.

Foram necessárias duas décadas até que fosse conseguida autorização para que a substância pudesse voltar a ser usada em investigações, com estudos em animais e humanos a confirmar que a MDMA não produz efeitos neurotóxicos nas doses administradas nos testes médicos.

No entanto, quando em doses maiores do que as aconselhadas ou se adulterada e misturada com outras substâncias potencialmente perigosas, a MDMA constitui um risco. Entre 2013 e 2014, a droga foi responsável por 8% das emergências relacionadas com drogas nos principais hospitais de dez países europeus.

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