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Políticos italianos, malteses e europeus criaram "um sistema de rejeição e interceção" de migrantes, reenviando-os para a Líbia, onde são vítimas de exploração, afirmou à Lusa o Centro Europeu de Direitos Constitucionais e Humanos (ECCHR).
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A ECCHR apresentou esta semana uma denúncia contra o ministro italiano dos Transportes, Matteo Salvini, o ex-ministro do Interior, Marco Minniti, e a ex-Alta Representante da União Europeia para Relações Exteriores e Política de Segurança, Federica Mogherini, por alegados "crimes contra a humanidade, contra migrantes e refugiados, interceptados no mar e sistematicamente enviados de volta à Líbia", onde são submetidos a "detenção sistemática".
"Decidimos apresentar queixa contra estas figuras políticas porque, em nossa opinião, havia consciência da violação dos direitos humanos na Líbia por parte deles", disse à Lusa o advogado de direitos humanos Chantal Meloni, consultor do ECCHR, que trabalhou anteriormente no Tribunal Penal Internacional.

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Segundo Meloni, o "sistema de rejeição e interceção" criado "delegava na guarda costeira líbia a incómoda tarefa de intercetar os barcos dos migrantes requerentes de asilo, conscientes de que seriam levados de volta para a Líbia, que não pode ser considerado um porto seguro de forma alguma".
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A investigação do ECCHR durou três anos e levou em consideração não apenas os acordos e tratados com a Líbia, mas também as declarações feitas no Parlamento pelos políticos denunciados.
"Queríamos fazer luz sobre o sistema de interceção de migrantes no mar e a externalização da gestão de fluxos implementada pela UE, confiando-a à chamada Guarda Costeira da Líbia, fornecendo financiamento, barcos de patrulha, equipamento e formação, bem como participando diretamente na interceção individual no mar, por exemplo fornecendo informações sobre a posição de embarcações em perigo", adiantou Meloni.
A política migratória da Itália nos últimos anos tem sido repetidamente objeto de críticas, mas também de investigações criminais, a principal envolvendo Matteo Salvini, ex-ministro do Interior entre 2018 a 2019, quando foi lançada a política de "portos fechados", dificultando o desembarque de migrantes por navios de Organizações Não Governamentais (ONG).
Em Palermo, realizou-se na sexta-feira nova audiência do julgamento em que Salvini é acusado de sequestro e recusa de documentos oficiais, por ter impedido em agosto de 2019 a atracagem em Lampedusa - segundo o Ministério Público de forma ilegítima - do navio da ONG catalã Open Arms, com 147 migrantes resgatados em alto mar.
Segundo Meloni, houve um "papel decisivo de altos funcionários da UE em relação à privação de liberdade pessoal a que são submetidos os migrantes e refugiados que fogem da Líbia".
No ano passado, a ECCHR apresentou uma denúncia semelhante junto do Tribunal Penal Internacional, concentrada na responsabilidade penal individual de atores de alto nível na Líbia por supostos crimes contra a humanidade cometidos contra migrantes e refugiados no contexto de sua detenção e trânsito em território líbio.
A nova denúncia, explicou a ONG, "introduz novos elementos fáticos e jurídicos relativos às operações por meio das quais migrantes e refugiados que fogem do território líbio são interceptados no mar e trazidos de volta à Líbia".
Segundo Meloni, com base nas informações recolhidas pela ONG que apresentou a denúncia "na Líbia existem organizações criminosas que utilizam um método mafioso para lucrar com os migrantes", que são "conduzidos a trabalhos forçados, na construção e nos transportes" e empregados como "apoio às milícias", mas também "tornaram-se reféns das organizações".
Meloni relata que, com base nos testemunhos recolhidos, encontraram "migrantes que foram sequestrados e cuja foto foi enviada via Whatsapp para as suas famílias para pedir um resgate".