"Putin não conseguia enganar Merkel. Precisávamos dela agora nas negociações"
Entrevista/ KATI MARTON

"Putin não conseguia enganar Merkel. Precisávamos dela agora nas negociações"

Norte-americana nascida na Hungria, viúva de Richard Hollbrooke, autora, historiadora e jornalista, Kati Marton mergulhou na vida de Angela Merkel e mostra-nos uma personalidade fascinante no livro "A Chanceler".

Kati Marton, a citação da chanceler Merkel no início da edição portuguesa do seu livro, resume ou pode ser o que melhor descreve a estratégia política de Merkel ao dizer que o que importa é o que será feito em dois anos e não o que será lido no jornal de amanhã?

Isso resume absolutamente a sua marca única de fazer política, que realmente não é sobre as notícias e manchetes. É sobre o impacto a longo prazo. Entre muitas coisas, ela também é historiadora; ela está muito ciente da terrível história sombria da Alemanha e da capacidade do homem para o mal. Ela leu muito sobre história e estudou profundamente o Holocausto. E, assim, ela é tudo menos otimista. Ela, realmente, não tem fé na humanidade. Ela acredita no trabalho diário de salvação, não como a maioria dos políticos em ganhar manchetes. Mas é claro, ela também é muito astuta, e eu diria, até estratega e política. Ela trabalha simultaneamente para manter o apoio do povo, porque, como política, precisa do apoio do seu povo, não pode estar muito à frente do seu povo. Mas, ao mesmo tempo, ela está sempre de olho na história. E, a longo prazo, o que a torna bastante incomum. Como político, nunca encontrei um político que tivesse tanta consciência da história. E o longo prazo em oposição às manchetes de amanhã.

Poderíamos dizer que está muito mais orientada para os efeitos de longo prazo do que com sondagens, por exemplo...

É interessante, mas ela usa muito as sondagens. Porque ela nunca quis perder o apoio da população. Quer dizer, não se esqueça, ela foi reeleita quatro vezes, 16 anos como chanceler... Tu não te consegues manter em funções se as pessoas não estiverem contigo. Então, ela é uma estratega astuta, e sempre mediu a temperatura da população. E a propósito, hoje em dia, estamos a ver que ser chanceler da Alemanha não é tão fácil quanto ela o fez parecer. Ela tinha esse dom, dando uma aparência de estar tudo bem, tudo normal. 'Não há razão para se preocuparem.' E isso exigiu um esforço tremendo, um corte tremendo com todos os vários interesses na Alemanha, o interesse empresarial, os verdes, a extrema-direita, a extrema-esquerda, o Partido Conservador, que não se esqueça que ela fazia parte da CDU, os Cristãos Democratas. Então, um Partido Conservador, que ela conseguiu transformar à sua maneira tranquila, de modo que se parece muito mais com um Partido Socialista agora, depois de 16 anos de Merkel, do que era originalmente.

Mas ela fez isso por estar muito em contacto com o que o seu povo - a população alemã - estava a pensar, sentindo e nunca indo muito à frente. A única grande exceção a isso foi 2015, que foi quando me interessei em traçar o perfil dela e descobrir quem é essa mulher que permitiu que um milhão de refugiados do Médio Oriente, muçulmanos, entrassem num país bastante homogéneo, branco e cristão. E ela fez isso num momento em que os seus vizinhos, membros da União Europeia, estavam a erguer cercas e a construir muros. Quem é esta mulher? Esse é o objetivo do meu livro: passar para lá da sua fachada de ferro, porque ela não gosta de revelar quem ela é. Ela é a funcionária pública mais privada do mundo, eu diria. Então, este foi o meu desafio, para capturar a história humana desta personalidade.

Tendo isso em conta, como foi seu acesso a Merkel? Quão difícil foi e com que frequência aconteceu durante o processo de escrever o livro?

Bem, eu descreveria isso... Este é meu 10.º livro, eu descreveria isso como o Evereste dos projetos de escrita em termos de dificuldade. Mas fiz à moda antiga. Isso é persistência, aparecer muitas vezes, fazer muitas viagens a Berlim, de Nova Iorque, e muitas, muitas viagens à Chancelaria, onde acabei por construir relações de confiança. Eu tinha algumas vantagens. Primeiro, sou de uma origem semelhante à de Merkel. Nasci e cresci na Hungria ocupada pelos soviéticos, assim como ela foi criada na Alemanha Oriental ocupada pelos soviéticos. Então eu entendia de onde ela vinha e a sua necessidade de controlo da privacidade, porque ela cresceu num estado de polícia secreta, que tinha a Stasi. Essa polícia secreta tinha uma penetração mais profunda no sistema da Alemanha Oriental do que a Gestapo...

Eu li no seu livro... havia 170 mil informadores, cinco vezes mais do que no tempo da Gestapo...

Sim, sim, incluindo o seu parceiro de laboratório, porque ela era cientista antes de se tornar política, como sabe. O seu parceiro de laboratório estava a informar a polícia secreta sobre ela. Então, é claro, esta não é uma pessoa que confie facilmente nos outros. E essa falta de confiança realmente serviu-lhe bem na carreira política, porque significou que ela conseguiu esconder a sua ambição, e esconder a sua estratégia, e o facto de ser uma mulher brilhante que adaptou essa fachada de não ser ameaçadora, quando, na verdade, ela era muito ameaçadora para os seus colegas políticos do sexo masculino.

Quando ela nasceu em 1954, Hamburgo, onde nasceu, estava a ser reconstruída e crescia rapidamente em termos de importância económica para o país. Ao mesmo tempo, não já não havia mais a ilusão de que a RDA pudesse ser uma democracia. Quão grande foi a influência no pensamento político de Merkel esse facto, de ter sido criada num país dividido, com duas visões de mundo contraditórias e em conflito?

Bem, dois fatores importantes moldaram Angela Merkel. Primeiro: o facto de ter crescido no estado da Stasi, onde não se podia confiar em ninguém. E onde ela aprendeu a esconder as suas ambições e o seu brilhantismo. Porque não valia a pena destacar-se. Pode ver nas fotos do meu livro, que ela está sempre ao fundo da sala na escola. E assim continuou, ela entra numa sala silenciosamente, diferente de qualquer outro político que já conheci, ela não quer muita atenção. E é notável o quanto uma pessoa pode fazer quando atua assim. E esse tem sido o segredo dela. Fazer as coisas com as pessoas mal percebendo que ela o está a fazer. Quer dizer, foi assim que ela transformou a Alemanha silenciosamente, e sem chamar atenção para isso. Foi assim que ela abriu a Alemanha não apenas para um milhão de refugiados, mas também para as mulheres. As mulheres agora foram empoderadas. Foi assim que a igualdade no casamento se tornou lei. Não porque ela fez grandes discursos e fez muito barulho sobre isso. Ela é, aliás, uma péssima oradora. Mas isso funciona bem no contexto alemão, porque os alemães sabem onde seguir um orador carismático e ardente os pode levar, os seus pais estavam vivos durante os anos de Hitler. Então, isso está no ADN dela, assim como no ADN do povo alemão.

Então, a segunda coisa é que ela é filha de um pastor. O seu pai era um pastor luterano muito duro e rígido nos seus padrões para a filha, que nunca parou de tentar obter a sua aprovação. Ele nunca votou nela, pode imaginar? Porque ela declarou a sua independência dele juntando-se à CDU, aos democratas-cristãos, e ele era socialista. Ela sempre foi a sua própria pessoa. Sempre foi ferozmente independente. Mas, do pai, ela aprendeu essa moral da necessidade de cuidar dos mais necessitados.

E isso vimos na sua abordagem aos refugiados, que descrevi como o seu momento Martinho Lutero ('aqui estou, não posso fazer outra coisa'), e, realmente, pelos padrões dela, diante de um milhão de refugiados miseráveis ​​que ninguém mais queria - a Hungria acabara de os expulsar - Orbán estava a construir vedações o mais rapidamente quanto podia. Este foi o momento de Merkel, quando ela decidiu que não faria uma sondagem sobre como os seus colegas alemães se sentiam sobre isso, ela faria a coisa moralmente certa. E, a propósito, apesar de lhe terem dito que isso acabaria com a sua carreira política, isso não aconteceu, porque os alemães seguiram o seu exemplo, e sete milhões de alemães estiveram envolvidos em ajudar os refugiados. Assim, a Alemanha sob Merkel tornou-se não apenas a potência financeira e económica da Europa, o que já era, e ela sustentou isso; mas tornou-se o centro moral da Europa. E, eu diria, do mundo porque - lamento dizer, mas o meu país, os Estados Unidos, desistiu dessa posição durante o Governo Trump.

Podemos dizer que ela também seguiu, de alguma forma, o caminho do pai, que quando todo a gente ia para a República Federal, ele foi para a Alemanha de Leste para ajudar os mais necessitados?

Ela aí não tinha escolha. Ela era um bebé de berço, quando o seu pai decidiu ir contra a corrente e ir do Ocidente paraLeste porque ele era um zeloso luterano. E, como sabe, a RDA era um estado ateu e ele respondeu ao apelo para pregar na Alemanha Oriental, e isso foi um enorme sacrifício para uma família alemã. Mas ela aprendeu, ao mesmo tempo, sobre o papel da responsabilidade de serviço público. E também o tipo de valores que vimos em 16 anos de Merkel como chanceler: humildade, modéstia, vida simples.

Esta é uma chanceler que nunca deixou o seu pequeno apartamento, no coração de Berlim. É onde ela está agora. Nunca adquiriu mansões, castelos, iates, propriedades, não significam nada para ela. Nem um sopro de escândalo em 16 anos, nem um único livro de memórias de ex-funcionários. Quando Barack Obama se foi despedir dela em 2016, disse: 'Oh meu Deus, vocês ainda estão todos aqui.' Porque, claro, ela tinha a mesma equipa que tinha oito anos antes. Ela começou e terminou com a mesma equipa. Então, quero dizer, esta é uma mulher que realmente tem a capacidade de incutir lealdade porque trata a sua equipa como seres humanos. Não os trata como um monarca. Ela não... sabe, manda neles, mas, por exemplo, tenta não ligar aos fins de semana. Há tantas lições que os políticos podem aprender com ela. Às vezes, Ricardo, quando escrevia este livro, senti como se estivesse a escrever o Volume Dois de "O Príncipe de Maquiavel". A Princesa. Ela tem muitas lições para ensinar a qualquer pessoa interessada em poder: como obtê-lo, como mantê-lo. Não apenas às mulheres, mas a toda a gente: seja modesto, seja humilde. Não grite o que você fez. Não grite quais são os seus planos. Apenas faça.

Podemos dizer que ela se empoderou politicamente, também por ser mulher, além de ser uma mulher do Oriente? Quão importante isso foi no que viria a ser o seu futuro político?

O seu primeiro grande mentor, o chanceler Helmut Kohl, escolheu-a porque ela era uma mulher do Leste, e brilhante. Todos notaram o seu brilhantismo, a memória fotográfica, a competência e o facto de ela trabalhar mais do que todos. E ele errou ao pensar que ela não seria uma ameaça. E, novamente, isso ajudou-a em cada centímetro do caminho porque os homens sempre a subestimaram, porque ela não era apelativa. Ela não era barulhenta. E Merkel acabou com a carreira de Kohl quando ele foi apanhado num escândalo, um escândalo de luvas, corrupção. Ninguém mais na CDU teve coragem de dizer "Helmut, estás a prejudicar o partido." Pelo contrário, apenas Merkel o fez; e isso abriu caminho para a Chancelaria. E terminou a era Kohl.

Ela foi chanceler durante esses 16 anos e a Kati diz que ela foi muito pragmática na abordagem às autocracias...

Ela é uma política calculista. Ela considera uma perda de tempo atacar abertamente pessoas como Xi Jinping ou Vladimir Putin. Putin foi o seu relacionamento mais longo. Eu descrevo isso como um casamento disfuncional porque eles passaram muito tempo juntos... Mas ela era a única que Putin respeitava. E você pode ver agora na Ucrânia que ele está a testar o Ocidente. Está a testar a UE pela primeira vez desde que Merkel saiu e, a propósito, a UE não está a ir muito bem sem ela, porque não há mais ninguém que esteja a reunir a UE, para falar a uma só voz como ela fez durante a primeira crise na Ucrânia, onde ela negociou em nome de todos no Ocidente, não apenas da UE, mas Obama basicamente nomeou-a negociadora para o Ocidente porque ele, Obama, não podia lidar com Putin. Ele disse-lhe, "Ei, esse homem mente-me o tempo todo." E ela disse: "Bem, adivinhe lá? Ele também me mente a mim." Mas ela não tinha escolha. Ela teve que negociar com ele, porque basta olhar para o mapa e vemos que a Rússia está muito perto da Alemanha, e não vai embora.

Então, ela bloqueou com sucesso a agressão russa na Ucrânia, não foi um sucesso perfeito, mas interrompeu o avanço russo. E eu só espero que haja alguém que possa ocupar o seu lugar hoje nas negociações com Putin, porque ela estava mesmo disposta a ficar na mesa de negociações, ela não ia apenas voar e jantar, falar durante uma hora e foi embora. Ela estava lá dias e noites com um conhecimento de cada passo da milícia russa, que ele negou ser a sua milícia, mentindo como sempre. Cada centímetro de território que os russos conquistaram ela conhecia, ela entrava na reunião com um mapa e com fotografias e a dizer: "Conheço todas as árvores do Donbass", a região para onde os russos foram. E assim ele não a poderia enganar. E é disso que precisamos na mesa das negociações.

A certa altura, ela disse que a única maneira de saber a hora do dia durante aquelas negociações em Minsk era se estavam a servir pão e geleia ou um assado. Então esse é o nível de foco e resistência em que ela tinha a capacidade de bloquear tudo o resto e apenas concentrar-se no que estava a acontecer ali no terreno. E esse foco vem da sua formação como cientista, ela era física e uma boa física. E a capacidade de reunir evidências pouco a pouco e não aceitar a palavra de ninguém, mas sempre usando os factos no terreno e confrontando Putin com as suas mentiras. Isso é do que precisamos, em nome de todos nós, hoje.

Devemos chamá-la novamente e liderar as negociações em nome do Ocidente?

Ela é muito esperta para voltar depois de 16 anos, ela não quer ser rainha da Alemanha. Ela não quer ser uma ditadora. Ela é uma democrata, e a forma que ela saiu foi a sua última lição de democracia. É assim que deve funcionar. Ela não fez como Trump, ela não contestou o resultado. Ela não disse "estou a fazer um ótimo trabalho, deveriam manter-me", ela saiu silenciosamente, não teremos notícias dela por um bom tempo.

Um dia até teremos, porque ela é muito jovem para se reformar. Ela está em boa forma, mas precisa descansar depois de 16 anos. É a primeira vez que ela é uma pessoa livre. Porque viveu 35 anos sob a Stasi, e depois 16 anos como chanceler; sempre cercada. Então agora vai saborear e desfrutar da liberdade, mas eu prevejo que ela, com o tempo... quer dizer, não estará de volta a um emprego, porque o que pode alguém alemão ser depois de ser chanceler da Alemanha durante 16 anos? Mas a falar como uma estadista veterana em duas questões: uma, o clima, o seu grande portfólio inacabado porque ela passou de uma crise para outra: a crise financeira, a crise migratória, a crise nuclear de Fukushima. Depois, tirou a Alemanha da rede nuclear. E, claro, teve quatro anos de Trump e de ir lidando com ele. Chegou ao seu discurso final de véspera de Ano Novo para a nação. O único discurso que ela faz, que é o de Ano Novo... Foi aí que ela anunciou que seria a chanceler do clima para o resto do mandato, e seis semanas depois veio a Covid. E, assim, tornou-se gerente de crise para a Covid. E, portanto, não chegou ao clima. Então, eu penso que isso está inacabado e penso que vamos ouvir dela sobre isso.

Quais serão, na sua opinião, os altos e baixos mais significativos do seu tempo de Chanceler?

Bem, ela é humana, ela não é perfeita. O livro não é totalmente lisonjeiro... não é uma hagiografia o meu livro. Descrevo os seus pontos negativos. Acho que seguir em frente com o gasoduto Nord Stream, trazendo gás e petróleo diretamente da Rússia para a Alemanha, foi demasiado para a Alemanha. Quero dizer, ela era chanceler da Alemanha, mas sabe, a União Europeia é a sua visão, uma Europa solidamente unida é a sua visão, especialmente depois de os EUA terem elegido Trump, e especialmente com Putin a ameaçar, então esse é um ponto negativo. Outro ponto negativo é que ela não se concentrou o suficiente na Alemanha Oriental, que é um ponto problemático hoje. Ela é uma alemã oriental e nem todos os alemães orientais conseguiram fazer a transição do Leste para o Oeste como ela fez. E, porque ela é uma pessoa tão hiper-racional, ela quase subestima o elemento irracional na tomada de decisão das pessoas. Deveria ter passado mais tempo a reconhecer o sofrimento e a dor dos seus colegas alemães orientais. Como resultado, há agora um movimento de extrema-direita na Alemanha, principalmente no Leste.

Mas quero dizer uma coisa, Ricardo, o movimento de extrema-direita está a perder terreno na Alemanha. Agora está nos 9% de apoio. Não é um movimento crescente. A Alemanha será o último país europeu a tornar-se populista. Porquê? Porque passou muito tempo focada no seu capítulo mais sombrio da História. Merkel foi parcialmente responsável por esse foco e por ter ido a Israel, falado com o Knesset, foi a primeira chanceler a fazê-lo. E disse que a responsabilidade da Alemanha para com os judeus é uma das razões de existência da própria Alemanha, o que é uma declaração surpreendente para ligar uma nação ao destino de outra.

Mas, assim, a Alemanha fez o trabalho duro, que - lamento dizer - nós, nos Estados Unidos, não fizemos, sobre os nossos capítulos mais sombrios. Mas, posto isto, o Leste da Alemanha tem uma limitada mas infeliz falta de responsabilidade sobre a história da Alemanha, e é muito mais suscetível à extrema-direita e a Putin. E todo o movimento anticiência, o movimento antivax, está no Oriente. E isso também estava sob a sua responsabilidade. O AfD, a Alternativa para a Alemannha, está agora no Bundestag, pela primeira vez um partido de extrema-direita no Parlamento alemão desde a Segunda Guerra Mundial, embora não seja um movimento poderoso ou em crescimento. No entanto, está lá. E temos que culpá-la por isso. Parcialmente.

Ela tem, como a Kati disse antes, uma vida privada normal. O marido Joachim Sauer, sempre se recusou a estar sob os holofotes. Como disse, ela é jovem e está em boa forma, mas pensa que será lembrada como alguém sobre quem se pode dizer... como ela própria deseja ser lembrada... como alguém que tentou... "ela tentou"?

Ela nunca quis responder essa pergunta: como quer que seja o seu legado? Porque ela acha que não depende dela. Cabe a nós, historiadores, decidir. É um pouco cedo, mas eu diria que o seu legado será muito simples: ela transformou a Alemanha num Estado muito mais aberto, tolerante e humanitário. E para as mulheres, meu Deus, foi um modelo incrível. A líder mais poderosa do mundo, o político mais popular do mundo, é uma mulher agora. E uma mulher que gosta de mulheres. Ao contrário de Margaret Thatcher, cercou-se de mulheres, mulheres poderosas. A sua protegida, Ursula Von Der Leyen, é uma figura poderosa na UE. E isso... quero dizer, é muito notável transformar o seu país sem que o país mal perceba isso, porque ela trabalha tão silenciosamente e sistematicamente para dar às mulheres esse grande exemplo e modelo. Não é um legado mau, de todo.

Nasceu na Hungria. Como vê a Hungria hoje, politicamente?

Bem, estou muito perturbada com o rumo antidemocrático de direita da minha antiga pátria. Não é o que esperávamos. Conheço o Viktor Orbán há muito tempo, ele não começou como um autocrata. Ele começou como um reformador democrático. Agora é realmente o homem de Putin na UE. E isso é muito perigoso para a União Europeia e para a NATO também. E, portanto, espero que nas próximas eleições de abril os húngaros votem noutro candidato, mas Orbán está no poder há muito tempo, é muito corrupto. Ao contrário de Merkel, ele tornou-se um homem muito rico, mais parecido com Putin, e toda a sua família ficou muito rica. E isso é errado.

Há uma boa alternativa. Um conservador do interior, autarca de uma pequena cidade, com sete filhos. Eu não o conheço, mas parece ser um homem decente. E acho que os húngaros precisam mudar e precisam regressar ao caminho da democracia, se quiserem permanecer membros da União Europeia, que é o que a maioria dos húngaros deseja. A União Europeia tem de perceber que este é um país que desafia os valores fundamentais básicos. E isso não pode ser, é perigoso para a Europa.

Não está preocupada que a única maneira possível de remover Viktor Orbán do poder seja formar uma coligação que reuna um Partido Social Democrata, mas ao mesmo tempo um partido como o Jobbik, apesar de o Jobbik, que era um partido de extrema-direita, agora alegar que mudou muito?

A Hungria precisa de mudanças. A Hungria precisa de um novo líder, não sou político. Obviamente, eu preferiria que Jobbik ficasse fora do poder. Mas penso que o mais importante é uma mudança de Governo, e depois tornar a extrema-direita uma voz muito pequena nos assuntos húngaros, da mesma forma que a extrema-direita é uma voz muito pequena nos assuntos alemães e, espero, continuará a ser uma pequena voz no meu próprio país, os Estados Unidos, mas estou muito preocupada com isso.

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