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João Dias ou João da Adega, como é conhecido nas redondezas, tem apenas a 4.ª classe. Os versos saem naturalmente a este homem que vive no sítio da Adega, na freguesia de Querença, no interior do concelho de Loulé." Tenho uma veiazinha poética, já sou descendente de poetas", diz para explicar a sua tendência para versejar. As quadras nascem-lhe espontâneas." Às vezes queremos escrever umas quadras e não saem em condições, noutras ocasiões chovem, não tenho explicação", adianta. Lembra que começou em pequeno a cantar à desgarrada com a fadista Cidália Moreira, nas festas de verão.
Lurdes Lourenço também começou a construir versos desde pequena, aos 7 anos. Baseia-se na sua experiência de vida.
"É nas minhas vivências, naquilo que se está a passar no dia-a-dia. Vem a Páscoa, vem o tempo dos folares, eu faço uns versinhos de toda a maneira e feitio", revela.
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Lurdes já completou 75 anos. É no seu jardim, rodeada de flores e de pássaros, que se inspira. É requisitada por toda a gente para fazer versos. "A minha filha já diz ó mãe tu és do povo!", " Vem uma e diz ó D. Lurdes não me faz uns versinhos? Ó mãe tu não paras!", lembra a sorrir. Esta mulher, que mora na pacata aldeia da Tôr, também no concelho de Loulé, cita quadras de cor:
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"Hoje sexta-feira, dia 13/ Dizem que é azarento/ Mas por acaso tivemos sorte/ Que nem sequer fez vento". E mais uma " Ser pobre não é defeito/ É o que toda a gente diz/ Defeito é ser avarento/ Porque não consegue ser feliz".
Ambos, Lurdes e João, elogiam o poeta maior, António Aleixo, o poeta do povo que também viveu no concelho de Loulé e tem uma escultura em sua memória à frente do café que frequentava, o Café Calcinha.
João Dias acompanha habitualmente as suas quadras ao som da guitarra, instrumento que aprendeu a tocar já em adulto. Faz questão de cantar para o microfone um episódio caricato que presenciou e que deu mote a algumas quadras: A fuga de uma porca que era transportada para uma matança numa carrinha. Quando chegou ao local, o bicho escapou-se, andando muitos dias a monte sem que ninguém a conseguisse apanhar.
"Foi numa sexta-feira/ Que a porca extraviou/ Parece uma brincadeira/ Mas o caso se passou/
Ó porca marafada/Fugiu e não deu mão/ Por isso não foi assada/ Nas brasas do carvão." Na voz do poeta popular, a porca e a sua aventura ficarão para sempre no cancioneiro da terra.