O Sindicato Nacional dos Quadros Técnicos Bancários pede 6,25% de aumentos para o setor e apela ao Governo para criar medidas de incentivo à poupança.
Para combater a inflação é preciso que sejam criados incentivos à poupança. O presidente do Sindicato Nacional dos Quadros Técnicos Bancários (SNQTB), Paulo Gonçalves Marcos, defende na entrevista a Vida do Dinheiro que está na altura do Governo criar um pacote de medidas para a criação de poupanças de médio e longo prazo.
O bancário reconhece "que os bancos prestam uma função social e por isso são alvo de uma regulação social e têm uma licença" mas Paulo Gonçalves Marcos também lembra que "o Banco Central Europeu e os bancos centrais têm muita culpa neste pico de inflação porque durante 6 anos praticaram taxas de juro negativas e com isso impulsionaram a criação de moeda e a formação de bolhas especulativas no norte da Europa na área dos activos imobiliários".
Nesse sentido, "reconhecendo que talvez os bancos centrais tenham ido longe de mais nas suas políticas acomodatícias não há dúvida de que remunerar os depósitos faz sentido mas faz sentido ser também consequente, isto é, criar o enquadramento legal, regulatório e fiscal que incentive os portugueses a fazerem poupanças de médio e longo prazo visando a sua reforma", argumenta Paulo Gonçalves Marcos.
O presidente do SNQTB reconhece que os trabalhadores do setor "estão num ponto de ruptura, com uma inflação de 10% e os bancos a duplicarem os resultados em 2022 e as tabelas salariais a serem negociadas com médias de aumentos de 1,1%, estamos a falar de perdas superiores a um mês num só ano".
O SNQTB pede aumentos de 6,25% e lembra que em Espanha os bancários foram aumentados mais de 4% quando em Portugal os bancos pouco passam de 1% de valorização salarial, mesmo assim o presidente do sindicato pensa que 2023 não vai ser um ano de greves.
"Não vejo que haja necessidade de fazer greve mas também não imagino que haja necessidade de fazer processos de despedimento, não me parece que seja aceitável", defende.
O presidente do Sindicato Nacional dos Quadros Técnicos Bancários é também presidente da União dos Sindicatos Independentes (USI) que tem lutado por integrar a Concertação Social.
"O presidente do Conselho Económico e Social (CES), Francisco Assis, já suscitou a questão. Existem um conjunto de entidades significativas que deviam estar presentes no CES, cujo plenário tem 50 entidades e julgo que a maior parte delas tem menos associados e representatividade do que a União dos Sindicatos Independentes. Este é um processo legislativo e tem que ser votado por maioria de 2/3; não tenho a certeza de que o desfecho seja diferente dos últimos 20 anos. Isto é curioso, à medida que os movimentos sindicais clássicos se vão esbatendo e perdendo relevância continuam agarrados a posições que já nada representam, mas espero que haja um desfecho positivo para bem da democracia", conclui.
Paulo Gonçalves Marcos é há sete anos o presidente do Sindicato Nacional dos Quadros Técnicos Bancários, que faz parte da União dos Sindicatos Independentes.
Quadro superior do Novo Banco desde 1995 e professor da Universidade Católica Portuguesa onde ensina marketing e estratégia, faz parte dos órgãos sociais de instituições particulares de solidariedade social.
É licenciado em Economia pela Universidade Católica Portuguesa e mestre em Gestão pela Universidade Nova de Lisboa. Paulo Gonçalves Marcos, bem-vindo A Vida do Dinheiro.
O Governador do Banco de Portugal tem defendido a subida das taxas de juro praticadas pelos bancos na remuneração das poupanças como forma de controlar a inflação. Mário Centeno adianta que esta é uma função social dos bancos. Partilha desta posição?
Concordamos, embora normalmente não estejamos de acordo com várias coisas que diz o Governador, mas neste caso estamos em comum.
É óbvio que os bancos prestam uma função social e por isso têm uma regulação especial e uma licença que, na prática, permite criar moeda e com isso gerar economia.
É preciso lembrar que os bancos centrais, e o Banco Central Europeu, têm muita culpa neste pico de inflação porque durante seis anos praticaram taxas de juro negativas, tendo com isso impulsionado a criação de moeda e, quiçá, bolhas especulativas em alguns mercados do norte da Europa na área dos ativos imobiliários.
Portanto, nesse sentido, reconhecendo que talvez os bancos centrais tenham ido longe demais nas suas políticas acomodatícias, não há dúvidas de que remunerar os depósitos faz sentido.
Mas faz sentido ser consequente, isto é, ser consequente é criar o enquadramento legal, regulatório e fiscal, que incentive os portugueses a fazer poupanças de médio e longo prazo visando a sua reforma.
Quer as famílias, quer as empresas, porque de facto estamos muito carentes. E ao mesmo tempo que o senhor Governador proferiu estas declarações, saiu um estudo que diz que apenas cerca de um em cada seis portugueses poupa para a reforma.
Portanto, creio que talvez seja uma boa oportunidade para os bancos subirem as suas taxas de remuneração de depósitos, o que está a acontecer, e penso que nas últimas semanas isto tem sido evidente.
Mas, simultaneamente, é preciso criar o enquadramento regulatório e legal que permita que isto seja consequente e que seja um movimento que beneficie a sociedade portuguesa.
Ou seja, não apenas poupança ao deixar o dinheiro no banco, mas investir em PPR?
Sim, há claramente uma oportunidade, considerando que temos taxas de substituição, entre o último salário e aquilo que vão ser as pensões, que são muito baixas. Como segundo país mais envelhecido da OCDE, vamos ter taxas de substituição muito baixas.
Dado o nosso nível salarial, teremos taxas de substituição de 50%/60% num futuro a curto-prazo, isto vai ser problemático. Portanto, uma das coisas é fazer como se faz no norte da Europa em que se estimula a criação de um segundo e terceiro pilar.
Portanto, é importante remunerar as poupanças, não de curto-prazo, mas acima de tudo de médio e longo-prazo. Deve haver um conjunto de estímulos para que empresas, entidades patronais, associações, sindicatos e famílias, desenvolvam um verdadeiro mercado de segundo pilar.
Acho que é uma boa oportunidade para começarem a desenhar e combinar a poupança, estimulá-la, tirar dinheiro de circulação e com isso reduzir as pressões inflacionistas. E, ao mesmo tempo, precaver o futuro dos portugueses, acho que era uma tripla oportunidade.
Nos primeiros nove meses deste ano, os cinco maiores bancos que operam em Portugal cobraram 1057 milhões de euros em comissões bancárias, mais 15% do que no mesmo período de 2019, antes da pandemia, da guerra, e numa lógica de taxas de juros baixas.
Agora, as taxas de juro sobem e as comissões sobem. Há argumentos para que isso aconteça?
É uma questão que deve colocar aos banqueiros. Posso dar-lhe a minha opinião enquanto cidadão e economista e, acessoriamente, enquanto dirigente sindical.
O que temos dito é que a rendibilidade da banca europeia e da banca portuguesa está muito abaixo daquilo que é a rendibilidade histórica e daquilo que é a realidade nos mercados asiáticos ou no continente europeu.
Isso tem colocado um conjunto de constrangimentos ao desenvolvimento do setor financeiro na Europa e em Portugal é provável que esteja mais exacerbado porque tivemos o impacto da crise 2011/2014.
De facto, cobrar comissões quando refletem serviços prestados, acho que aí estamos todos a favor, mas cobrar comissões e aumentá-las se não houver serviços associados acho que é uma prática de repudiar vivamente.
Tenho a certeza de que com a margem de intermediação positiva que agora existe, não haverá certamente tanto escopo para continuar a tentar fazer conta de exploração a partir das comissões.
Temos um caso na banca portuguesa, e à medida que os bancos têm vindo a recuperar paulatinamente e se aproximam de níveis de remuneração que permitem atrair novos capitais para injetar na atividade, recentemente um grande banco de centro de decisão em Portugal emitiu dívida de médio e longo-prazo a 8,5%.
Quem tomou a dívida são basicamente investidores institucionais e internacionais, mas tudo aparenta que é preciso remunerar capitais dos acionistas à volta dos 10% para continuar a ser atrativo.
Os bancos portugueses ainda estão algo distantes dessa meta, estão a aproximar-se, o que para nós, enquanto trabalhadores, é bom sinal. E também é bom sinal para a economia, porque significa que as instituições vão continuar a fazer as suas funções e a fazê-las bem.
Um dos outros temas que temos na banca é que, à medida que os bancos portugueses têm vindo a recuperar, porque este movimento de margem de intermediação positiva não tem tido a capacidade e vontade de fazer uma redistribuição de rendimentos entre o fator trabalho e o fator capital.
Portanto, nesse sentido, enquanto deploramos subidas muito acentuadas das comissões nos casos em que possa não haver um serviço associado. E mais grave ainda é que os acionistas têm sido basicamente os únicos beneficiários.
Acho que temos condições para fazer isto de forma diferente e acho que o regulador esteve bem há uns anos atrás quando criou a figura da conta dos serviços bancários mínimos.
Aí há claramente uma alternativa para as famílias portuguesas, o que acho muito positivo e muito salutar.
Com quase dois mil milhões de euros de lucros no terceiro trimestre deste ano, os cinco maiores bancos portugueses têm argumentado para não remunerar os trabalhadores. Com este nível de lucros há argumentos para não remunerar os trabalhadores?
Obviamente que não. Aliás, isto parece uma piada de mau gosto, mas a maior parte destes bancos presentes em Portugal são subsidiárias ou controlados por bancos estrangeiros.
Ainda ontem à noite estava a receber um relatório da Alemanha e alguns dos bancos presentes no mercado português, estão a entregar verbas aos trabalhadores para mitigar o impacto da inflação.
Portanto, aqui temos um problema muito grave, porque houve um conjunto de sindicatos, por uma qualquer estratégia com certeza defensável, que no início do ano se prestaram a fazer um acordo em que se previa aumentos médios na casa dos 1%.
Já na altura as expectativas de inflação apontavam para algo, no mínimo, na casa dos 4%. As negociações da banca, tipicamente, arrastam-se por dez ou onze meses e depois são feitas de forma retroativa, e este ano houve uma alteração do padrão.
Mas para responder à sua questão muito concretamente, apesar dos níveis de rendibilidade ainda estarem abaixo daquilo que exigem os acionistas, estão muito acima de um passado recente.
Este ano, os grandes bancos vão ter o melhor resultado dos últimos 15 anos e tudo aparenta - se as previsões económicas continuarem a situar a situação económica portuguesa em terreno moderadamente positivo para o ano -, que 2023 seja o primeiro ano dos últimos 17 em que o nível de rendibilidade cumpre perfeitamente os exigentes requisitos dos investidores internacionais.
Portanto, a resposta é que há todas as condições e noutras geografias aqui ao lado, por vezes, os mesmos bancos têm políticas de remuneração muito mais adequadas.
Ontem à noite, só para dar uma ideia, a associação espanhola de bancos celebrou um acordo para 2023 de 4,25 apesar de ter um acordo celebrado a três anos em que previa 1,5 para 2023, por acordo com três das estruturas sindicais mais importantes, fez uma revisão antecipada do acordo, precisamente para ir ao encontro daquilo que achamos que será a inflação core.
Haverá aqui certamente componentes que se vão atenuar dos combustíveis e energia, uma certa normalização se a guerra acabar, desejavelmente, antes do próximo verão, mas há aqui componentes que vieram para ficar, como o preço dos serviços.
Há componentes voláteis que podemos e pedimos aos bancos para fazerem a entrega de uma só vez, aquilo a que se chamaria uma verba única, mas há efeitos estruturais e vê-se aqui ao lado a associação espanhola de bancos a corresponder.
E o que é atávico é que deste lado da fronteira os portugueses são tratados de forma diferente.
Este é um dos problemas que temos na economia portuguesa, claramente os portugueses emocionam-se com muitas coisas, como o futebol, mas emocionam-se menos com esta enorme redistribuição de rendimentos que está a ocorrer nestes últimos dez/doze anos.
Não é só a estagnação da economia, é também alguma anomia social e, por outro lado, uma falta de intervenção dos poderes públicos.
Porque não é compaginável quereremos viver num país moderno e, ao mesmo tempo, estarmos a fomentar a deslocalização do trabalho qualificado para fora das nossas fronteiras, destruindo todas as esperanças de uma sociedade.
Portanto, acho que este é um bom exemplo do outro lado da fronteira, os 4,25, e deste lado não sabemos, mas foi 1% este ano. Há aqui claramente uma dualidade sobre a qual é preciso agir.
Entre 2011 e 2021, de acordo com as séries longas do Banco de Portugal, foram perdidos 21 310 postos de trabalho no setor e menos 3027 trabalhadores do que em 2020. Igual tendência está a acontecer no número de agências e balcões.
Este ano continuam em curso processos de restruturação dos quadros de pessoal e da banca. Que balanço pode fazer?
Os números agregados que saíram a semana passada referiam-se ao setor financeiro, portanto, incluem também as atividades de seguros e mediação de seguros.
A atividade de seguros também teve um redesenho muito grande, porque as funções clássicas dos mediadores de proximidade têm vindo a ser redesenhadas e muito emprego se perdeu nesse subsetor.
Do lado da banca também é conhecido, o que acontece é que a maior parte dos bancos de proximidade fecharam agências. Ainda hoje estava a ver os números do Novo Banco e, aquando do colapso do BES, tinham 7500 trabalhadores e hoje tem pouco mais de 4000.
Nessa altura, tinha 700 balcões e hoje tem 300, portanto, há claramente um emagrecimento que só não é tornado pior nas estatísticas porque houve alguns bancos de capitais franceses que deslocalizaram para Portugal e criaram centros de competência que prestam serviços partilhados ao longo da Europa.
Por um lado, estamos a assistir ao fenómeno da digitalização e é impossível parar o vento com as mãos, mas aqui também houve muito oportunismo, nomeadamente em 2021, quando houve processos de restruturação mandados por geografias fora de Portugal.
Ou seja, estas casas-mãe mandaram cortar custos pela Europa toda e depois em Portugal não houve capacidade de resistir à pressão das casas-mãe, tendo acabado por haver um corte mais que proporcional ao que seria razoável.
Em 2021, o pretexto seria que no pós-pandemia e no retomar do mercado de trabalho, as estruturas estavam teoricamente redundantes, mas em 2022 não há dúvidas de que os bancos estão enxutos.
A rendibilidade está a subir, as perspetivas são boas, e nada justifica que continuem os processos. Até porque ao contrário de alguns arautos da desgraça, a digitalização veio para ficar, mas já começou há 18 ou 19 anos.
Assim como as pessoas continuam a ir aos supermercados, continuam a ir ao seu balcão para contratar um crédito. Claramente, continua a haver alguns momentos, mal comparado, mas até os não crentes continuam a ir à igreja nos batizados e funerais.
Continua a haver um conjunto de situações em que se requer a presença cara a cara e, portanto, as agências e os gestores de proximidade continuam a ser importantes. Não vejo razão nenhuma para que o movimento continue.
Pelo contrário, vejo cada vez mais deslocalização de postos de trabalho qualificados de outras geografias para Portugal. Os trabalhadores portugueses são qualificados, são resilientes, e parece que são bastante mais mal pagos do que nos mesmos empregos noutras geografias.
Diz que nada justifica que continuem os processos de restruturação. Está em causa a paz social na banca?
Em 2021 houve três greves na banca: uma na Caixa Geral de Depósitos a que aderiram três dos seis sindicatos; uma greve no Santander e uma greve no Millennium em que aderiram os sindicatos todos.
Foi a primeira vez, desde 1987, em que foi decretada uma greve em uníssono por todas as estruturas, quer pelos sindicatos independentes, quer pelos sindicatos afetos às centrais político-partidárias.
Não antevejo que 2022, que está quase a acabar, e que em 2023 haja necessidade. Não me parece que seja necessário fazer processos de despedimento, aliás, nem me parece minimamente aceitável.
Agora, os bancários estão num ponto de rutura. Depois de uma inflação de 10%, os bancos a duplicar os resultados em 2022, tabelas salariais a serem negociadas com quem representa menos de metade dos trabalhadores e que aceitam aumentos médios entre 1% e 1,1%, estamos a falar de perdas superiores a um mês num só ano.
Portanto, se para o ano não houver uma séria reivindicação, se os sindicatos não se unirem e se os trabalhadores não exigirem das lideranças sindicais firmeza de atuação, então vamos ter outra enorme perda de rendimentos.
Tivemos, durante o período da Troika, período em que foi preciso fazer sacrifícios e Vítor Gaspar alertava que era um enorme aumento de impostos. Pois, este ano, os trabalhadores portugueses já perderam mais do seu poder de compra do que durante o enorme aumento de impostos.
E os trabalhadores bancários não foram exceção e, se me permitem, talvez sejam até dos setores mais sacrificados. Este é um grito da classe média e imagino que 2023 será um ano muito combativo.
A federação de sindicatos a que pertencemos entregou a proposta para o próximo ano pedindo 6,25, justificando isto com base na inflação média esperada pelos quatro principais institutos - Banco de Portugal, Instituto das Finanças Públicas, OCDE e FMI -, e entrámos em conta com os ganhos de produtividade e com a remuneração dos capitais próprios da banca, e chegámos a um valor que achamos justo.
Não há muita margem para ir abaixo disto. Ainda bem que os bancos dobraram os resultados este ano, é sinal que estão a trabalhar e a servir a economia, tudo aponta que para o ano venham a crescer mais 40% ou 50% e que, finalmente, tenham resultados normais.
Portanto, esperaríamos que resultados normais que dão aumentos de 4, só nas bases e nas tabelas, sem contar que os níveis são muito mais altos, espero que aqui haja vontade e capacidade.
Não tenho a certeza de que haja vontade por parte dos decisores bancários, mas a tenho a certeza de que da parte dos bancários vai haver muita vontade em alterar. Agora não há desculpa, os bancos portugueses são dos mais eficientes da Europa.
Comparamos muito bem nos rácios de custos por proveitos com França, Itália ou Alemanha, mas temos níveis salariais que são muito, muito abaixo destes países que mencionei. Não há nenhuma razão para estarmos calados.
Disse que 2023 vai ser um ano muito combativo e falou na importância dos sindicatos se unirem. Os diferentes sindicatos vão realmente unir-se? Nos últimos tempos não se tem verificado essa união.
Desde que cheguei a estas funções, e não acho que sou presidente do sindicato, estou apenas como presidente de um sindicato, portanto, isto é uma situação temporária. Mas uma das coisas que me fez mais impressão foi a falta de concertação.
Numa das cadeiras iniciais do curso de Economia, estudava-se o dilema do prisioneiro, e isto é uma situação de dilema do prisioneiro. Acho que os bancários também já perceberam que não faz sentido os seus representantes andarem desunidos.
Desde que aqui chegámos, reiteradamente, e fizemo-lo seis anos consecutivos, escrevemos uma carta a todos a convidá-los para virem à mesa de negociação em conjunto.
Aliás, nos professores há 23 sindicatos e não é por isso que não negoceiam com o ministério em uníssono. Acho que os bancários perceberam, conseguimos fazer estas greves em conjunto em 2021, por motivos que até admito que tenham a ver com o ciclo político.
Porque isto de ser independente dá muito trabalho, não dá benesses, queremos ser próximos dos sócios, mas sem sermos próximos num sentido negativo de quem quer que seja no poder político. Isto não é uma alavanca para nos aproximarmos do poder político.
Nunca poderíamos assinar acordos minorantes em anos que toda a gente antevia que seriam maximizantes em inflação e em resultados líquidos dos bancos. Vou voltar a escrever a todos os meus colegas para nos juntarmos a uma só voz novamente, e acho que será difícil recusarem o convite.
O que é que vai escrever nessa carta?
O que tenho feito ano após ano, uma mesa comum de reivindicações, uma plataforma para fazermos uma exigência razoável e falarmos a uma só voz. E, acima de tudo, para que ninguém tenha a tentação de fazer acordos que não beneficiam a longo-prazo.
Os dirigentes sindicais, como qualquer dirigente de qualquer associação, têm de ter uma visão de longuíssimo prazo que não é compatível com ciclos político-eleitorais, não pode ser.
Por isso, os sindicatos devem e têm de ser independentes e só responder aos seus sócios. É, talvez, bizarro que em Portugal mais de 90% dos sindicatos sejam independentes dos partidos políticos, e que a concertação social tenha sido moldada com base no 25 de novembro e com os vencedores do regime da época.
Portanto, é bizarro que a concertação social no continente deixe de fora aqueles que representam 90% das estruturas. Há aqui uma espécie de um duopólio entre duas centrais sindicais e isso não representa os trabalhadores.
Também há setores que representam uns 60% do PIB e que estão fora da concertação, é totalmente bizarro.
Não fico nada impressionado com acordos de concertação social anunciados ao domingo, negociados com entidades que não são muito representativas, e que não têm qualquer capacidade de fazerem vincular os seus sócios aquilo que assinam a um domingo.
Falou em exigências razoáveis. A exigência razoável são os 6,25 que pede, apesar de em Espanha a negociação ter ido para os 4,25, muito abaixo do valor da inflação? Se não chegarem a estes patamares, e também considerando que há uma grande penetração da banca espanhola em Portugal, este valor de 4,25 seria aceitável pelas administrações dos bancos?
Deixe-me colocar isto em contexto: em Espanha, o acordo de rendimentos que foi celebrado para três anos, em média, deu mais do que os acordos que alguns sindicatos apressadamente assinaram em Portugal.
Portanto, a base de partida é outra, além de que os salários médios neste setor de intermediação financeira, são 40% a 60% mais altos para as mesmas funções, em Espanha.
Finalmente, enquanto cá se fizeram despedimentos coletivos - e dissemos na altura que, grande parte, foi sem qualquer necessidade ou fundamento -, em Espanha, o mecanismo de redução passa, tipicamente, por reformas antecipadas e programas com muito mais conteúdo social.
Portanto, estamos a falar de realidades diferentes, com bases diferentes. Ou seja, 4,25 para quem teve aumentos combinados, mais do dobro dos portugueses parecem muito mais aceitáveis.
Não assinámos o acordo de 2022, aliás, ainda ontem começou a primeira etapa sobre os hospícios da DGERT, onde solicitámos um processo de conciliação porque será difícil perceber como é que 2022, com resultados a crescer entre 70% a 100%, alguns bancos se obstinem em querer dar aumentos aos seus trabalhadores na casa do 1%.
Portanto, temos de ver 2023 combinado com o nível de exigência que não foi possível ter em 2022, mas que creio que, não havendo interferência política, a razoabilidade das nossas reivindicações vai fazer-se sentir.
Alguns bancos, como a Caixa, o BCP, o Santander e o Montepio, avançaram com apoios pontuais extraordinários aos trabalhadores, no sentido de aliviar o impacto da inflação. É este o caminho ou isto é uma cenoura no pau à frente do burro?
Escrevemos aos bancos todos, portanto, às 47 entidades presentes em Portugal, no dia 23 de setembro, solicitando aquilo que disse que se chama uma verba de sentido único, entregue para mitigar os efeitos da inflação, mas que não substitui os termos da negociação coletiva.
E repito, para 2022 não tendo chegado a acordo com os sindicatos independentes que representam muito mais trabalhadores no ativo na banca, estamos na DGERT para tentar chegar a um entendimento.
Mas, além disso, e como a inflação vai em cerca de 10%, como os bancos já fizeram pagamentos de 1% ou 1,1% aos seus trabalhadores, há aqui um gap imenso. Achamos que há uma componente absolutamente estrutural que tem de ser resolvida em negociação coletiva, como sempre.
E há uma componente que a todos nos apanhou de surpresa, que foi esta alta dos preços da energia e dos combustíveis.
E essa, ainda que vá regularizar, o que é certo é que ao longo destes sete meses, os portugueses viram o gasóleo subir de 1.6 para 2 e andaram a pagar isso durante estes longos meses.
Portanto, a verba única não substitui, mas é uma situação urgente em que os trabalhadores, genericamente, perderam um mês de salário em nove meses. É uma forma das empresas que têm capacidade - e no setor financeiro essa capacidade existe -, fazerem este ano uma medida de boa vontade e de mitigação.
Não substitui, não é estrutural, mas é claramente uma medida conjuntural. Desde que escrevemos essa carta, tivemos reuniões com diversos bancos e vários se mostraram disponíveis e têm feito movimentos.
Fizemos um comunicado ainda hoje de manhã a chamar à atenção para os bancos que ainda não fizeram movimentos. Há cinco bancos, o maior da Europa, o terceiro maior da Europa, que ainda não fizeram movimentos em Portugal, assim como dois bancos do top 5 dos bancos de retalho.
Mas apraz-me registar que, por exemplo, já várias entidades fizeram como bancos de cariz local, tais como as caixas de crédito agrícola mútuo, fizeram apoios substantivos perto dos seus trabalhadores e comunidades.
Acho que esta é a forma de gerir, é perceber os problemas das pessoas com quem esses dirigentes trabalham.
Portanto, vejo com alguma estupefação como é que dois grandes bancos de retalho em Portugal e três entidades gigantescas à escala europeia, não o fazem em Portugal.
Uma destas entidades, um banco estrangeiro, no seu país de origem fez uma verba única de 1200 euros e um aumento extraordinário de mais 3% nas tabelas, mas aqui nem responde às cartas nem aos pedidos de audiência.
Acho que nas próximas semanas vamos ter claramente de chamar a responsabilidade social destas empresas e alertar a opinião pública, se assim for necessário.
Julgo que isto se pode resolver com bom senso e tranquilidade, mas os portugueses não podem ser uma versão moderna da escravatura do século XVI, isso não faz sentido nenhum.
Estas ajudas pontuais e extraordinárias também têm sido realizadas pelo Estado. Como é que tem visto estes apoios do Estado para os contribuintes?
Vejo muito bem e sou insuspeito, mas vejo muito bem. Acho que devia haver um apoio muito mais vibrante aos trabalhadores que têm de fazer deslocações pendulares para ir trabalhar, e outros países têm apoios mais generosos.
Há países com políticas de subsidiação do transporte público muito mais vibrante e nós temos muitas condições para fazer mais e melhor. Depois, o apoio dos 125 euros é certamente bem-vindo, mas vamos ser sinceros: era possível e teria sido desejável ter ido mais além.
Repito, vários países europeus foram muitíssimo mais além e o disparar da atividade económica em 2022, com uma retoma inesperada, felizmente, com as retomas positivas do turismo e do IVA, permitiu ao senhor ministro das finanças ter um tesouro de guerra que, obviamente gerindo com parcimónia e cautela como se espera, teria sido possível ir muito mais além.
Portanto, também teria sido possível anunciar este apoio antes do final do verão e com um valor muito superior. Se me permitem, outra medida que em devido tempo saudámos foi o decreto de lei 57C/2022, publicado no início de outubro sobre o componente extraordinário aos pensionistas.
Aplaudimos a medida, enfim, a oposição e a comunicação social farão o trabalho que têm de fazer, mas aí só temos uma discordância que levaremos às últimas consequências, que é, num universo de 3 milhões 160 mil pensionistas, ficarem de fora 50 mil reformados pensionistas bancários.
E não têm culpa de serem pensionistas bancários, pelo contrário, têm muito orgulho. Em 1935, a União Nacional, um estado no mínimo autoritário, criou os grémios e fundiu trabalhadores e sindicatos com associações patronais.
E também criou caixas de previdência para um conjunto de profissões, entre as quais os jornalistas, advogados, solicitadores, bancários, trabalhadores do comércio, etc.
Os trabalhadores bancários foram integrados nessas caixas de previdência, não foram consultados que eu bem me lembre, em 1976 foi criada a Segurança Social e ficou prometido que todos seriam integrados.
Mas houve dificuldades técnicas, é o que diz o relatório do grupo de trabalho na altura, e não foi possível integrar os bancários, e depois não foi possível em 1982, e isto arrastou-se até ao início de 2009 quando, em 2 de março, sai um diploma que diz que a partir do dia seguinte todos os novos bancários passavam a ter segurança social.
Muito bem. Isso resolveu algum tema, mas ficaram por resolver aqueles que, entretanto, se foram reformando. No dia 31/12/2011 passaram para a segurança social as responsabilidades para com os bancários que estavam reformados nessa altura - deu muito jeito para compor o défice, para pagar à indústria farmacêutica os medicamentos dos hospitais, deu muito jeito para não entrar e procedimento excessivo, foram 6100 milhões que passaram para a Segurança Social -, quase 40 mil bancários foram assim integrados.
Mas, o Estado, apesar de ter recebido o dinheiro, deixou-os de fora deste decreto-lei. Pedimos audiências ao senhor Presidente da República, aos grupos parlamentares, ao senhor Primeiro-Ministro - aliás, já tivemos oportunidade de lhe fazer chegar os nossos argumentos -, pedimos um parecer ao professor Rui Medeiros, uma das grandes figuras do Direito Constitucional português, autor de mais de 20 livros, professor catedrático e que foi ministro. E é esse parecer que estamos a fazer chegar.
Pedimos aos grupos parlamentares para intercederem. Tenho orgulho em dizer que a democracia funciona. A Iniciativa Liberal fez uma pergunta à senhora Ministra do Trabalho para saber o porquê, o Bloco de Esquerda fez um aditamento a este decreto-lei, que teve muitos votos e, finalmente, o Partido Comunista Português fez um aditamento que teve o apoio de toda a oposição.
Portanto, o Partido Socialista ficou sozinho. Tenho muita pena porque é um partido muito estruturantes para Portugal e para a democracia portuguesa, mas esta obstinação, estamos a falar de cerca de 1,5% do total dos pensionistas que foram esquecidos.
E foram esquecidos, mas também são contribuintes e, portanto, quem está a pagar este complemento extraordinário é o Orçamento do Estado, não é a Segurança Social, não é nenhum putativo excedente da Segurança Social, somos todos nós.
E, portanto, deixar de fora uns, acho que há todas as oportunidades de corrigir e, com certeza que foi um lapso, que será corrigido.
Mas, para responder à questão, e não quero fugir, somos favoráveis a estas medidas, quer das empresas, quer do Estado para ajudar as famílias, os contribuintes portugueses, os trabalhadores a ultrapassarem um período e que se nada for feito de forma vigorosa, teremos um processo de empobrecimento que nos levará a níveis de rendimento e a um padrão de distribuição de rendimentos muito mais próximos da América Latina do que da Europa do centro com que gostamos de nos comparar.
Esse parecer que pediram a Rui Medeiros levou a fortes críticas por parte de outros sindicatos do setor. Queria saber como é que vê essas críticas e, quando diz que estão dispostos a levar até às últimas consequências, estão a referir-se a quê? A ir para tribunal?
Pedimos à senhora Provedora da Justiça, ao senhor Presidente da República e aos grupos parlamentares para solicitarem ao Tribunal Constitucional para averiguar e solicitar a inconstitucionalidade do decreto-lei porque ele viola o princípio da igualdade, o nº 13 da Constituição, viola, e de forma flagrante porque ninguém pode ser discriminado, privilegiado, favorecido ou ficar em detrimento por qualquer condição social, económica, profissional, familiar, ou seja, ninguém pode ser prejudicado na sua dignidade.
Prejudica de forma exemplar os pensionistas e reformados bancários porque já não têm idade para reconstituir a sua vida, e também a Constituição fala disso - o direito especial de proteção aos mais idosos e aos mais vulneráveis -, viola claramente princípios de subordinação do Estado de Direito à Constituição.
Portanto, é nosso entendimento que foi uma peça legislativa muito infeliz. Ao mesmo tempo, recolhemos um número muito interessante de assinaturas para obrigar a que este tema seja discutido em plenário. Ou seja, no fórum apropriado.
Ainda hoje mesmo a Comissão Parlamentar da Segurança Social, Trabalho e Inclusão nomeou um relator para preparar esta apresentação e ainda vamos ser ouvidos. Tenho esperança de que, nos primeiros meses de 2023, este tema seja trazido ao plenário e seja discutido e votado em plenário porque é muito importante que isso aconteça.
Pedir um parecer a um constitucionalista é uma coisa que toda a gente disse que ia fazer, nós fizemo-lo. E, por isso, aceito todas as sugestões, todas as críticas de espírito democrático. Acho que todos os sindicatos estão em uníssono nesta questão e, portanto, não vejo divergência de fundo sobre isto.
A União dos Sindicatos Independentes, de que faz parte, não está na concertação social. Se estivesse, subscrevia o acordo de rendimentos?
A União dos Sindicatos Independentes que é uma central sindical relevante, nós temos aqui um sinal de miopia e que lembramos de uma ou duas coisas e não lembramos da terceira e isso acontece em muitas coisas da nossa atividade.
Estamos presentes no Conselho Económico Social e na comissão permanente da concertação social na Região Autónoma da Madeira, e aí a nossa postura serve como exemplo.
Na Madeira, ano após ano, temos unanimidade ou uma imensa maioria na nossa presença nos parceiros sociais, laborais, empresariais, governamentais, sempre sobre o acordo de rendimentos.
Acho que a nossa postura crítica está lá, mas respondendo à sua questão, um acordo de rendimentos que não vincula, que não estabelece um horizonte de repartição de ganhos de produtividade, que não fomenta a poupança de longo prazo, que não é claro como vai estimular o investimento privado e a criação de emprego qualificado, é um acordo que merece ser revisitado e bastante melhorado.
Como é que está o processo de adesão à mesa de concertação social?
É um tema que o presidente do Conselho Económico Social e de Portugal continental, Dr. Francisco Assis, já suscitou esta questão. Existe um conjunto de entidades significativas, quer do setor empresarial, quer do lado laboral - nós - que julgamos que temos de estar presentes.
Portugal continental tem um plenário com cerca de 50 entidades. Tenho a certeza de que uma boa parte delas tem menos membros e menos representatividade do que os sindicatos independentes.
Este é um processo legislativo e tem de ser votado por maioria de dois terços. Não tenho a certeza de que o desfecho seja diferente do que foi nos últimos vinte anos.
Há vinte anos que continuamos a tentar e, isto é curioso, à medida que os movimentos sindicais clássicos se vão esbatendo e perdendo relevância, continuam agarrados a posições que já nada representam, mas espero que haja um desfecho positivo para o bem da democracia.