- Comentar
Sobre a tentativa de golpe de estado na Guiné-Bissau e o aparente fim da acalmia que o país africano tem vivido no último par de anos, o ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros diz na TSF esperar "que tenha sido apenas um acidente de percurso". A Guiné-Bissau "desde 2019 tem feito um percurso muito interessante de consolidação institucional, com a realização das eleições legislativas e depois das eleições presidenciais, tem as autoridades e os órgãos de soberania todos constituídos e é importante que essa consolidação institucional prossiga. Foi, infelizmente, um ataque armado e bem preparado, porque realizou-se ao palácio do Governo quando o Conselho de Ministros estava reunido e em que o próprio Presidente da República participava, presidindo ao Conselho de Ministros, mas felizmente as cadeias de comando funcionaram e o ataque foi debelado". O chefe da diplomacia portuguesa espera "que a investigação se faça, no sentido de apurar as responsabilidades, e o percurso de estabilização institucional da Guiné-Bissau prossiga".
Relacionados
"O primeiro-ministro sabe tudo o que penso e sei tudo o que ele pensa"
Augusto Santos Silva n'O Estado do Sítio. Veja a entrevista na íntegra
Morreram sete militares e paramilitares que se posicionaram em defesa dos elementos das autoridades políticas que se encontravam reunidos em Conselho de Ministros, na presença do Presidente da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, adiantou o porta-voz do governo guineense, Fernando Vaz, que salientou a "robustez e meios armados" utilizados pelos agressores para justificar a constatação. Afirmou que a intenção da intentona era "criar o caos, facilitar o caminho de imediato ao crime organizado internacional" e, assim, colocar em causa o trabalho de "refundação do Estado" em curso na Guiné-Bissau.
Agora na Guiné sem sucesso, mas antes Mali, Burkina Faso... O presidente da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) alertou esta quinta-feira para uma "tendência perigosa" de "contágio" de golpes de Estado em África. Akufo-Addo disse que esta é uma "tendência perigosa", que deve ser enfrentada "coletiva e resolutamente, antes de varrer toda a região", depois de o Mali ter sofrido dois golpes de Estado desde agosto de 2020, de ter ocorrido um outro na Guiné-Conacri (em setembro de 2021) e mais um no Burkina Faso, a 24 de janeiro.

Leia também:
"O primeiro-ministro sabe tudo o que penso e sei tudo o que ele pensa"
Para o ressurgir de uma maior frequência de acontecimentos deste tipo, Augusto Santos Silva, na entrevista ao programa O Estado do Sítio, encontrou explicação na "penetração do terrorismo em toda a região do Sahel, à instabilidade securitária que se vive em toda essa região, e também alguma ambiguidade em relação às questões estratégicas, que se vê bastante bem no caso do Mali, mas também um pouco mais a sul no caso da República Centro-Africana. Como não gosto de falar redondo, estou a referir-me ao facto de, em ambos os países, as autoridades terem de escolher se consideram que o seu parceiro ideal para a capacitação e segurança é a UE ou considerarem que o seu parceiro ideal é a empresa de segurança privada russa Wagner, porque as duas coisas são incompatíveis".
Subscrever newsletter
Subscreva a nossa newsletter e tenha as notícias no seu e-mail todos os dias
Para capacitar o estado moçambicano de competências militares para conter e derrotar o terrorismo, há uma missão militar europeia de formação e treino em Moçambique, liderada por Portugal, mas esta semana uma denúncia dos Médicos Sem Fronteiras dava conta do regresso dos combates à província de Cabo Delgado. Augusto Santos Silva lembra que "nestas coisas relativas à segurança, não podemos ter um entendimento mágico do mundo. As coisas não mudam automaticamente da noite para o dia ou do dia para a noite. São processos de longo curso". Mas também não esconde algum orgulho em como as coisas foram feitas, por parte de Portugal e da UE em relação a Moçambique: "é, até agora e julgo que vai continuar a ser, um caso exemplar", estando certo que isso será enfatizado "devidamente pelo primeiro-ministro português nas suas intervenções na cimeira União Europeia-União Africana", marcada para o próximo dia 17. O MNE usa como argumento para a sua constatação o facto de os parceiros europeus terem trabalhado "desde o início com as autoridades moçambicanas, no sentido da nossa disponibilidade em apoiar as autoridades a responder aos desafios e ameaças que elas identificavam e a pôr no terreno as decisões que elas escolhiam". Ou seja, nada foi imposto de fora, como noutros contextos e com outros protagonistas terá acontecido, numa abordagem neocolonialista e paternalista que, desta vez - garante Santos Silva - não existiu.
O governante português está convicto de que a situação no terreno em Moçambique se modificou bastante, a favor da estabilidade em Cabo Delgado, mas nós continuamos a apoiar os moçambicanos nessa estabilização". Mas não só. Também "em duas ameaças que não devemos esquecer: a primeira é o ressurgimento de focos de instabilidade e insurgência na própria província de Cabo Delgado; e a segunda, que também se nota, é a tentativa por parte de organizações terroristas de ganhar fôlego noutras províncias do norte e centro de Moçambique".

Leia também:
Augusto Santos Silva n'O Estado do Sítio. Veja a entrevista na íntegra
O ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros acaba de publicar um livro de balanço da presidência portuguesa da União Europeia a que deu o nome "Tempo de Agir na Europa". A TSF perguntou a Augusto Santos Silva se o tempo de agir agora é o de... evitar uma guerra no leste do continente: "eu diria que a nossa necessidade mais premente e mais imediata é evitar um conflito armado no leste da Europa porque isso seria um desafio à arquitetura da segurança europeia". Augusto Santos Silva não quer o regresso daquilo que o continente viu nas guerras dos Balcãs nos anos noventa, para não se voltar a essa dura realidade, "é preciso uma combinação de diálogo e firmeza".
Mas o ministro dos Negócios Estrangeiros também diz que as atitudes recentes da Rússia estão longe de ajudar a uma boa relação com o ocidente, assumindo que, sobre a relação entre o bloco europeu e o maior país do mundo em superfície: "os últimos movimentos da Rússia têm agravado. Estou a referir-me à colocação em massa de soldados de forças russas na imediata vizinhança da Ucrânia. Os exercícios militares de larga escala e inoportunos na Bielorrússia (que vão passar para uma nova fase, na próxima semana, a partir de 10 de fevereiro), agravam a situação. E nós temos respondido com diplomacia e política, mas também com a firmeza que é indispensável."