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André Ventura e o partido Chega foram condenados, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, a pedir desculpa a uma família do Bairro da Jamaica, por ofensas. O caso remonta ao debate com Marcelo Rebelo de Sousa na campanha para as eleições presidenciais, em que Ventura chamou "bandidos", apontando para uma fotografia da família.
Tanto Ventura como o partido ficam sujeitos a pedir desculpa públicas à família Coxi, com recurso a uma publicação, oral ou escrita, nos meios de comunicação social que reproduziram as declarações: SIC, SIC Notícias e TVI. O pedido tem ainda de ser publicado na conta do twitter do partido, assim como a condenação.
Os réus têm 30 dias para acatar a sentença, e a partir deste período ficam obrigados a pagar uma coima de 500 euros. No futuro, caso se voltem a reptir ofensas à família, Ventura e o Chega têm de pagar uma multa de 5000 euros.

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No acórdão, a que a TSF teve acesso, a juíza explica que estão em causa "ofensas ao direito à honra e ao direito de imagem" da família Coxi. A magistrada considera as declarações graves, até porque foram exibidas em canal aberto.
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A juíza diz ainda que distinguir entre "bons e maus, pessoas de bens e bandidos, não reflete a natureza humana, nem pacifica as comunidades".
"Sabendo-se que todas as pessoas humanas partilham a mesma humanidade, que cada uma dessas pessoas tem em si mesma a capacidade para o bem e para o mal, devendo a censura social ser dirigida aos atos praticados e não às pessoas, esta diferenciação redutora entre bons e maus, entre pessoas de bens e bandidos, não reflete a natureza humana, nem pacifica as comunidades humanas", lê-se no acórdão.
O líder do Chega foi processado por sete membros da família residente no bairro da Jamaica, por se terem sentido ofendidos com as palavras e com a fotografia em que apareciam junto de Marcelo Rebelo de Sousa. A família interpôs uma ação em tribunal, exigindo um pedido de desculpas.
Além de Ventura, a família também acusou o partido de racismo, suportando-se numa publicação nas redes sociais em que se comparam duas fotografias: a famosa imagem de Marcelo com a família Coxi, e uma de André Ventura junto de elementos da polícia, após uma manifestação. Entre as imagens, a frase "André Ventura apoio os portugueses de bem".
No início do julgamento, quatro meses depois do caso, Ventura garantiu que não ia pedir desculpa à família Coxi, justificando-se com a "dinâmico do debate", e afirmando que apenas se referia a um elemento da família.

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"É uma excelente sentença"
A advogada que representa o Bairro da Jamaica, Leonor Caldeira, aplaude a decisão tomada pelo tribunal.
"É uma excelente sentença. Sabemos que ainda pode haver recurso e, portanto, estamos a aguardar, mas é uma sentença que nos deixa muito satisfeitos porque reconheceu não só a ilicitude das ofensas, ao direito à honra e à imagem, como decretou as restantes providências que tínhamos requerido, nomeadamente a declaração de retratação no prazo de 30 dias, a publicação da sentença nos meios de comunicação social onde as ofensas foram originalmente proferidas e também a obrigação de se absterem. É uma decisão que nos deixa muito satisfeitos", explicou à TSF.
Ouça as declarações da advogada à TSF
Leonor Caldeira considera que esta é uma decisão que interessa a todos.
"Esta decisão tem, obviamente, um relevo de interesse público. Num estado de direito democrático, como sabemos, são os tribunais que decidem as linhas vermelhas da liberdade de expressão e esta sentença confirma que não é possível, a um ator político, humilhar e instrumentalizar pessoas negras, pobres e anónimas como arma retórica e instrumento de campanha política. Isso, para nós, também é muito importante", afirmou Leonor Caldeira.
A advogada dos queixosos fica também satisfeita com a rapidez deste julgamento.
"Sei que o André Ventura levantou algumas suspeitas quanto à celeridade do processo, mas não há qualquer estranheza e isso também nos deixa satisfeitos. A justiça funcionou bem, rápido e a favor das pessoas mais desfavorecidas, ou seja, a justiça não funciona só para os mais poderosos, mas também para as pessoas que são mais pobres e que estão em condição mais precária", acrescentou a advogada.