Fernando Medina (PS), Carlos Moedas (PSD), Beatriz Gomes Dias (Bloco de Esquerda) e João Ferreira (CDU) debatem o futuro de Lisboa num encontro organizado pela TSF e pelo DN.
A sala do arquivo da Câmara de Lisboa abriu portas para o debate entre os quatro candidatos à autarquia com representação no executivo da capital: Fernando Medina (PS), Carlos Moedas (PSD), Beatriz Gomes Dias (Bloco de Esquerda) e João Ferreira (CDU). As questões da habitação e dos transportes foram temas centrais do debate.
Maiorias absolutas à parte, Fernando Medina coloca a fasquia na "vitória" a 26 de setembro, "prosseguindo com o projeto de dar à cidade mais habitação acessível e transportes públicos de qualidade".
Questionado sobre o futuro no Partido Socialista (PS), caso não vença as eleições, Fernando Medina lembra que em discussão está apenas a liderança na Câmara de Lisboa.
Carlos Moedas garante não está pressionado pelas afirmações do secretário-geral do PSD, José Silvano, que reconheceu que uma vitória em Lisboa dará a vitória aos social-democratas na noite eleitoral.
"O que está em jogo é Lisboa. Não há nada que tenha a ver com a sede nacional do PSD", diz.
Coligações? Medina disponível para dar pelouros a CDU e BE
A candidata do Bloco de Esquerda (BE), Beatriz Gomes Dias, explica que o partido não avançou para uma coligação pré-eleitoral porque "tem um programa próprio, com características específicas" e quis medir o peso eleitoral que tem.
O acordo do BE com o PS em 2017 permitiu fazer avanços em várias áreas, como os manuais escolares gratuitos, que se estenderam depois a todo o país. As medidas do partido em 2017 foram concretizadas, e permitiram "transformar a forma de fazer política".
"Queremos uma cidade com mais casas que as pessoas possam pagar. Fazemos um balanço muito positivo do acordo que tivemos com o PS, que só foi possível com os votos dos lisboetas", mas a candidata do BE admite também que a questão da habitação "não correu bem" e sublinha que ainda há muito caminho para fazer".
"Estamos disponíveis para cumprir o mandato que nos for atribuído, assumindo todas as responsabilidades. Estamos disponíveis para concretizar medidas que mudem a vida das pessoas", lembrando que os pelouros dos direitos sociais e da educação "precisam de um trabalho de continuidade".
Fernando Medina admite que faz, "igualmente", um balanço positivo do acordo com o BE, "que permitiu desenvolver bastantes políticas". Ainda assim, lembra que a decisão de não avançar com um acordo pré-eleitoral foi do partido liderado por Catarina Martins.
"Nunca existiram obstáculos porque não chegámos aí. Não foi pelo PS que a coligação não é mais alargada", aponta.
Beatriz Gomes Dias contrapõe, assumindo que "só com um vereador não se consegue mudar toda a cidade". "Fazer um acordo pré-eleitoral impedia uma relação de forças que precisamos para impor um programa."
O candidato da CDU, João Ferreira, que não teve pelouros no último Executivo municipal, defende que "durante 12 anos, a CDU transformou a governação na capital, com responsabilidades diretas".
"Em 2021 faz precisamente 20 anos que a cidade não conheceu outra coisa que não fosse PSD/CDS, com seis anos de má memória; há 14 anos iniciou-se uma maioria do PS, no último mandato apoiado pelo BE", lembra.
João Ferreira acrescenta que "o acordo entre BE e PS" foi apressado, tendo em conta "o elevado grau de incumprimento" em várias áreas como habitação, transportes e cultura.
O candidato da CDU admite, no entanto, que se revê em algumas medidas aplicadas pelo Executivo nos últimos anos, "muito associados à intervenção da CDU".
Questionado sobre a possibilidade de aceitar pelouros, João Ferreira pede que a candidatura comunista "não seja desqualificada", lembrando que é candidato à presidência da câmara. Ainda assim, sobre um possível acordo à esquerda, explica que "quando a CDU não é maioria, não vira a cara às responsabilidades".
"Temos de ter os meios para desenvolver um trabalho compatível com o que nos comprometemos. Não chegaria ao final de um mandato com o grau de incumprimento atual", garante.
O comunista aproveita para criticar a postura do BE, "que deu um conforto ao PS durante quatro anos, viabilizando os orçamentos municipais".
Na resposta, Beatriz Gomes Dias pede que não se "criem divergências onde não existem", lembrando que o BE e o PCP votaram lado a lado em muitos dossiers da autarquia.
Por outro lado, a candidata bloquista lembra que o vereador comunista "viabilizou uma parceria público-privada" para a habitação". "O BE não é muleta do PS, e não assina cheques em branco", atira.
O atual presidente da câmara garante que não foi "por falta de disponibilidade do PS que não houve mais vereadores com pelouros atribuídos", mostrando-se satisfeito com a posição da esquerda para discutir um futuro Executivo.
Carlos Moedas caracteriza a discussão em torno do próximo Executivo municipal como um "namoro a três": "Estão a discutir quem será o melhor namorado, e quem vai contribuir para manter o que existe em Lisboa".
O candidato do PSD garante que a única alternativa de mudança é a sua candidatura, em oposição a três forças políticas "à procura de desculpas para continuar a fazer o que sempre fizeram".
"A Câmara Municipal está à deriva, com uma gestão à deriva, e os partidos discutem como continuar a fazer o mesmo. Os lisboetas estão cansados desta governação", diz.
Carlos Moedas: "Fernando Medina fala do PRR como se fosse dele"
Carlos Moedas considera que o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) é a "maior vergonha que estamos a viver", com um "PRR apenas para os que estão com o Governo".
"Vejo Fernando Medina falar do PRR como se fosse dele. Temos que ter muito cuidado, porque o PRR é o esforço de todos os portugueses. Temos de gerir o dinheiro de Bruxelas de maneira a que vá para as pessoas e não para outros lados, como aconteceu no passado", aponta.
Já Fernando Medina pede "um desconto" pelo que os líderes partidários vão dizendo ao longo da campanha eleitoral, referindo-se também às palavras de Rui Rio e Jerónimo de Sousa, que alegaram que o PS se sente dono do PRR.
"Em Lisboa, o PRR vai financiar apenas a extensão da linha vermelha do metro, um projeto que uniu todos os partidos", lembra.
O atual líder da capital recorda ainda que os fundos europeus vão permitir financiar o metro de superfície de Loures, reforçando a "necessidade de um desconto ao excesso de críticas".
Habitação em Lisboa: perspetivas e números
Quanto à habitação, Carlos Moedas afirma que "não tem uma proposta, mas sim um modelo", para alterar uma política de habitação que falhou em toda a linha. "O problema da habitação não se muda com uma medida, temos de ter medidas concretas para os que mais sofrem. Nos bairros municipais temos 1600 fogos fechados", afirma.
O social-democrata explica que "a ilusão que a esquerda tem, de que tudo se resolve pela mão da parte pública, está errada". Carlos Moedas afirma que as transações de arrendamento e compra em Lisboa superam as 20 mil.
"Temos que ter licenciamentos a funcionar a seis meses e não a anos, dando condições aos mais novos. Propomos a isenção do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) para os menores de 35 anos", acrescenta.
O PSD propõe requalificar dois mil fogos de habitações municipais, "parte do património da cidade", abrindo ainda concursos para jovens arquitetos.
Por outro lado, Medina garante que os números de Carlos Moedas, quanto aos fogos fechados, estão errados: "Não há, obviamente, 1600 fogos devolutos de propriedade municipal".
"A autarquia tem 2087 fogos habitacionais dispersos, estão ocupados 1481 e 386 serão demolidos. Libertos para ser requalificados são 153", explica.
Quanto aos bairros municipais, depois da "década em que a câmara de Lisboa esteve falida, conseguimos fazer o processo de recuperação", com 250 fogos a serem libertos anualmente.
Medina fala num "enorme investimento", mas João Ferreira lembra que, ainda assim, "ficou aquém do compromisso assumido: 10% por ano".
O presidente da autarquia assume "diferenças muito grandes" entre a direita e a esquerda nas políticas de habitação. "A coligação de direita não conhece bem o problema, nem apresenta propostas para o resolver", diz.
Fernando Medina acusa ainda o BE de preconceito ideológico quanto à parceria público-privada sobre a habitação, merecendo a concordância de Carlos Moedas.
João Ferreira responde ao social-democrata, afirmando que Carlos Moedas "não apresenta qualquer proposta para resolver o problema da habitação". "O privado está desenvolvido, e a isenção de IMI que Carlos Moedas propõe vai permitir 'borlas' aos que têm maiores rendimentos", explica.
O candidato da CDU entende que a autarquia tem "condições particularmente boas" para resolver o problema da habitação, defendendo que a posição de Carlos Moedas, "de que o mercado vai resolver, é irresponsável".
A candidata do BE defende "um plano 100% público, com uma gestão feita pela câmara". "Só assim é possível regular o mercado", explica.
Fernando Medina, por outro lado, garante que a proposta do BE "é irrealista".
"Gratuitidade nos transportes públicos é muito perigosa"
O candidato do PS lembra que "nenhuma solução pode resolver o problema da mobilidade na Área Metropolitana de Lisboa sem investimento", defendendo uma linha robusta de transportes públicos.
"O caminho da gratuitidade dos transportes públicos é muito perigoso e negativo. Fizemos uma grande reforma e descida no preços dos passes: hoje, o preço não é um obstáculo", garante.
Fernando Medina explica que a Carris e o Metropolitano perderiam 250 milhões de euros, rejeitando as propostas da esquerda: "Retirar receitas aos serviços públicos foi sempre o modelo da direita, não da esquerda."
Beatriz Gomes Dias, do BE, sublinha, ainda assim, que a gratuitidade tem de ser uma realidade "nos mais novos, mais velhos e desempregados", até para que deixem de usar os automóveis.
João Ferreira garante que, se for eleito, vai melhorar o serviço da Carris, "para que volte a passar em zonas e bairros onde deixou de ir".
Já Carlos Moedas volta a defender transportes públicos gratuitos para os jovens até 23 anos, dando vantagem aos lisboetas: "Os preços dos parquímetros têm de ser mais baratos."
"Vou trabalhar para os lisboetas. Em Amesterdão, por exemplo, quem vem de fora da cidade não entra com o carro na cidade: deixam-no num parque às portas de Amesterdão", explica.
Fernando Medina, de forma irónica, assume que num próximo debate dará parte do seu tempo a Carlos Moedas, para que o candidato do PSD explique "como criar parques dissuasores para 300 mil automóveis".