Um "teste do algodão", uma lua-de-mel em risco e um PSD de reformas sem "revolução"

Dos recados ao PS ao fim do recato de Montenegro, à recusa de Pinto Luz em participar na lua-de-mel do PSD com Rio e ao poder mobilizador de Carlos Moedas, estes foram os acontecimentos-chave de um Congresso Nacional feito de "esperança".

O mote do 39.º Congresso Nacional do PSD - "Portugal ao Centro" - já fazia antecipar que, a haver recados políticos a outros partidos, seria ao colo do PS que iriam calhar. A frase plasmada nos ecrãs do Europarque em Santa Maria da Feira - "Mantenha o lugar" -, uma advertência de cautela em contexto de pandemia, também refletia aquele que era um dos grandes objetivos de Rio: reforçar a sua posição enquanto presidente dos sociais-democratas, tentando projetar para fora uma aparente reconciliação interna, já a pensar nas legislativas.

Rui Rio apontou ao centro, onde conta ir buscar eleitorado, e, de preferência, roubá-lo ao PS. Apesar de sempre ter desvalorizado as sondagens, no dia em que o PSD galgava dez pontos e e se colava ao PS, de acordo com a recolha estatística da Aximage para TSF-JN-DN, o líder do partido pediu uma "clarificação" explícita ao PS e admite que sem maioria vai "negociar governabilidade"

O presidente social-democrata questionou se o PS vai "colaborar" ou "ficar amuado a um canto" caso não vença as eleições. O líder do PSD pediu, por isso, uma clarificação, e garante que, do lado dos sociais-democratas, há disponibilidade para garantir a governabilidade, que não se esgota nos Orçamentos e que inclui outro tipo de medidas e reformas.

O "teste do algodão" ao PS e possibilidade de novo líder socialista em março

"Nesta fase, é importante que o PS clarifique como é. Há uma probabilidade grande, como sabemos, de o PS perder as eleições: colabora ou fica amuado a um canto?", perguntou. Rui Rio justificou que "é necessário que os portugueses saibam com o que contar". Estas declarações à TSF aconteceram na mesma noite em que o antigo opositor do atual líder Luís Montenegro, ter desafiado Rio a fazer o que chamou de "teste do algodão" a António Costa. "Esta é a questão central: se o PSD ganhar as próximas eleições e se o PSD formar governo sem maioria absoluta, está o PS disponível para viabilizar dois primeiros orçamentos do Estado?", questionou.

O antigo líder parlamentar do PSD considerou que "o mais provável" é o PS ter um novo líder em março, antecipando uma derrota dos socialistas nas legislativas, e reiterando que os sociais-democratas estão "concentrados em ganhar" as eleições."Eu não sei se o PS vai mudar de líder em fevereiro ou março, se calhar vai. Se calhar o mais provável é que lá para março tenhamos outro líder do PS", previu.

Foi mesmo um Congresso cujos holofotes estiveram ao centro. Também Paulo Rangel, entrevistado pela TSF, afirmou que acredita que Rio tenha todas as condições para ganhar as legislativas, já que "não se vê nenhuma garra por parte do primeiro-ministro". Para o eurodeputado, Costa está "com uma força anímica" e o país "está numa espécie de conformismo".

No discurso final, Rui Rio voltou a acicatar a guerrilha com o PS, atacando com vigor os seis anos de governação socialista. Na sua intervenção, o presidente social-democrata, não só atacou o Executivo socialista por lhe ter faltado "vontade" para "apoiar" as pequenas e médias empresas, mas não para injetar dinheiro dos contribuintes na TAP e no Novo Banco, como demarcou o PSD como um "partido reformista", que alavancará o país, depois de uma Tutela que "adiou o país por seis anos".

O fim do "recato" e a voz "discordante" na lua-de-mel

Outro dos momentos que marcou este Congresso Nacional foi o retorno à militância política ativa de Luís Montenegro. que admitiu ter posto fim ao "tempo de recato". Há dois anos perdeu as eleições diretas com Rui Rio, e foi questionado pelos jornalistas acerca do futuro. "Eu andei sempre aqui e não mudarei a minha postura." O social-democrata justificou que, durante dois anos, o recato serviu para ajudar a eliminar do partido crispações e divergências.

"Empenhadíssimo em ajudar o partido a vencer as eleições", Montenegro garantiu que vai estar em campanha "ao lado de Rio e de outros candidatos", e, questionado pelos jornalistas, admite que "já não há motivo" para manter-se omisso.

Este encontro serviu também para Miguel Pinto Luz se voltar a revelar uma "voz discordante" no meio desta "lua-de-mel" que agora se vive no PSD. "É assim que eu exerço a minha militância."

"Parece que este Congresso estava meio morno", admitiu o autarca de Cascais, que garantiu ainda não ter discursado com o propósito de agitar as águas, mas de apontar que hoje o PSD "é um partido mais pequeno, sem os liberais e os conservadores, com menos diversidade e mais unicidade de opiniões".

Miguel Pinto Luz referiu ainda que o PSD se "afunilou ao centro e esqueceu todos os outros", vivendo hoje numa "unicidade", onde falta agregar outras visões do mundo, "senão é um partido de um homem só".

Pinto Luz disse, na sua intervenção no palco do Congresso, que discordou e continua a discordar "do caminho traçado pelo atual líder do PSD", e criticou a postura de Rui Rio - que já admitiu viabilizar um Governo socialista caso o PS ganhe as eleições sem maioria absoluta - afirmando que os sociais-democratas devem "transformar o país e devolver-lhe a capacidade de sonhar" sem contar com o PS.

"Queriam Colaço?"

A pergunta era retórica, mas a resposta não se fez tardar. A lista do atual presidente do Conselho Nacional de Jurisdição do PSD, Paulo Colaço, foi a mais votada pelos delegados ao Congresso, derrotando a apoiada por Rui Rio, encabeçada por Nuno Morais Sarmento, depois de ter protagonizado o episódio "mais quente" do Congresso, com o líder parlamentar Adão Silva. "Pessoas que comiam à minha mesa, vieram aqui bater. Porquê? Porque o presidente do Conselho de Jurisdição não disse às pessoas que tinham razão", atirou.

O presidente do tribunal do partido, que foi a votos para um segundo mandato, deu o exemplo do músico Keith Richards para defender a sua posição: "Não aparecia no set, não acordava a horas e quando acordava não estava pronto para consumo."

"O produtor foi ter com ele e disse-lhe: "Ouça, você bebe demais, fuma demais, não é profissional. Tem de ganhar juízo"", descreveu. O músico respondeu: "Queriam o Keith Richards? É isto." Paulo Colaço utiliza o exemplo do músico e atirou: "Vocês queriam o Paulo Colaço como presidente da Jurisdição? É isto." E foi.

Moedas leva o Europarque ao rubro e antecipa vitória nas legislativas

Carlos Moedas discursou no sábado perante o 39.º Congresso do PSD e recebeu a primeira grande ovação da sala do Europarque.

O autarca assumiu estar a "prestar contas", agradecendo o que todos os elementos do partido se tenham unido para tornar real a vitória em Lisboa, "numa situação que poucos achavam que fosse possível". O autarca lembrou os cargos que já teve ao longo de dez anos, destacando ter sido "secretário de Estado de Pedro Passos Coelho, que orgulho", e o trabalho enquanto comissário europeu. Foram "dez anos que passaram a correr".

"Derrotámos o PS duas vezes em dez anos, trouxemos esperança. Obrigado, PSD, obrigado por tudo o que me deram. Nunca esquecerei. É um enorme orgulho."

Carlos Moedas disse querer Portugal a navegar "na mudança e não no imobilismo que o PS quer impor", e retira duas lições da vitória em Lisboa: "Nós só ganhámos Lisboa porque estávamos unidos como partido. Só ganhámos porque respondemos concretamente às pessoas com um inconformismo que é tão nosso, que é moderado e do tamanho do mundo."

O autarca salientou a importância de gerar confiança, e essa confiança nasce da união, argumentou. "A partir deste Congresso, somos todos importantes, somos todos PSD", disse, arrancando aplausos de toda a audiência. "Estamos prontos ou não estamos prontos? Assim como mudamos Lisboa vamos mudar o país", exortou também.

Um PSD "reformista", mas que rejeita "revoluções"

Foi uma ideia assumida por Rui Rio: o PSD está pronto para a mudança, mas não vai mudar tudo de fio a pavio. "Estamos prontos para assegurar a diferença. Somos um partido reformista. Não vamos, por isso, fazer nenhuma revolução, nem vamos destruir tudo o que os outros fizeram. Queremos apenas, de forma sensata, mas corajosa e realista, desenvolver o nosso país e voltar a trazer a esperança aos portugueses." E que diferença é essa? Rio já antecipa a resposta, ao estabelecer a educação como prioridade, provendo mais condições de trabalho para os professores, ao fixar o Ambiente como área estratégica e a fiscalização de apoios sociais como vetor.

Rio vence Conselho Nacional, mas fações opositores continuam a "morder os calcanhares"

Foram disputadas as eleições para os órgãos nacionais do partido. O atual presidente do Conselho Nacional de Jurisdição voltou a vencer as eleições para este órgão do partido. A lista escolhida por Rui Rio e liderada por Morais Sarmento saiu perdedora. Colaço obteve 424 votos, contra os 390 de Morais Sarmento.

Já no Conselho Nacional, a lista de Rio reuniu 187 votos, contra os 161 de Pinto Luz. Mais atrás ficou Luís Montenegro, com 147 eleitores a votarem favoravelmente ao ex-líder da bancada parlamentar.

Apesar da "lua-de-mel" vigente, de que Pinto Luz falou, o partido continua dividido, pelo menos no que às votações diz respeito. Já no propósito de vencer o PS e de fazerem Rui Rio rumar a São Bento, o PSD fala em uníssono.

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