Votos dos emigrantes. "Quatro deputados não podem representar quase cinco milhões de portugueses"

José Cesário defende que o número de deputados eleitos pelo círculo da Europa não corresponde à quantidade de portugueses espalhados pelo continente, e postula que estes votantes não sejam mais "ignorados". Em entrevista com Fernando Alves, na Manhã TSF, admite também que Rio já não tem condições políticas para continuar na liderança, e reconhece que, com o tempo, a Assembleia da República tem ficado mais pobre na sua composição.

José Cesário assistiu "com tristeza" ao episódio que obrigou a repetir a votação do círculo da emigração nas últimas legislativas. Numa entrevista conduzida por Fernando Alves, na Manhã TSF, o deputado defendeu que a celeuma "acabou por se dar a ideia de que este setor estava relativamente ignorado", e só encontra, por isso, "uma virtude" em todo o processo: fará com que este círculo não volte a ser ignorado, espera o parlamentar do PSD.

"Quase todos os portugueses têm um familiar emigrado", argumenta José Cesário, referindo que os emigrantes devem estar "em pé de igualdade na vida pública", o que não se verifica quando os votos de uma população tão vasta servem para eleger apenas quatro deputados. Este "equilíbrio tem de ser acertado", analisa o social-democrata.

Por isso, "quatro deputados não podem representar quase cinco milhões com nacionalidade portuguesa", vinca. "Independentemente do número de portugueses que existem no exterior, nestas eleições, votaram, pelo menos, 250 mil pessoas. Não estamos a incluir aqui as dezenas de milhares de votos que devem ter chegado já depois da contagem. Ora, 250 mil votantes são mais do que os votantes do distrito de Leiria, onde são eleitos de deputados. Esta realidade não pode continuar a ser contemplada apenas com quatro deputados."

Deputado em 12 legislaturas e antigo secretário de Estado, nomeadamente na pasta das Comunidades, José Cesário foi entrevistado por Fernando Alves, no momento em que diz adeus à Assembleia da República, e a conversa teve forçosamente de tocar outras despedidas. O antigo governante garante que não está ansioso perante a demora na mudança de vida do PSD. "O calendário deve ser definido com muita tranquilidade. Importa que o doutor Rui Rio manifeste com clareza quais são as suas intenções."

No entanto, José Cesário é taxativo quanto ao ciclo de vida da liderança política do atual dirigente social-democrata: "É evidente que as condições políticas para ele continuar não existem, não são muitas." O antigo secretário de Estado sustenta, ainda assim, que Rio "deve continuar envolvido no processo de transição", e lembra que "o PSD sempre fez questão de tratar com muita calma".

De saída da Assembleia da República, o deputado que agora se reforma recorda com orgulho momentos como a elaboração da primeira lei de bases do sistema educativo e a aprovação de diplomas como a alteração da lei da nacionalidade, para alargar os direitos da comunidade estrangeira. Sobre o primeiro tema, garante que, mesmo já fora da vida parlamentar, "nunca" se escusará a pensar em todas as questões como um professor.

"Espero envolver-me um pouco nesta questão das escolas, dos professores", assinala o deputado que também percorreu "muitas terras sem estrada e sem luz", do interior português, entre 1979 e 1980. "Dessa herança nunca nos livramos", assegura. O primeiro docente e depois político deixa, contudo, um lamento: "Infelizmente os professores são uma classe que deixou de ser olhada como era."

Referindo-se a uma trindade de entidades de referência, que incluía o padre, o professor e o presidente da junta, José Cesário sublinha que o docente "deixou de estar no lote de entidades" que conhecidas por restabelecer "a ordem nas localidades". Para o deputado, o professor "tem de ter autoridade, tem de interagir com a comunidade", e o seu papel não pode ser desmerecido, porque, "sem educação, não há desenvolvimento".

Na hora da despedida, José Cesário faz questão de lembrar os mestres com quem mais aprendeu no Parlamento, desde logo, o professor Barbosa Melo e Almeida Santos, mas também Durão Barroso, com quem foi eleito deputado por Viseu, e Carlos Mota Pinto, o primeiro vice-primeiro-ministro com quem contactou.

A Assembleia da República mudou, isso é, para José Cesário, inegável. "Sim, o Parlamento está muito diferente. É evidente que a sociedade também mudou." Com um olhar atento, o deputado aponta que "já houve composições legislativas mais ricas", mas admite que "não é hoje fácil recrutar pessoas para a política", como era nos tempos do "fervor pós-revolucionário que fazia com que as pessoas se apaixonassem pela política".

Ao longo da semana, a TSF ouviu deputados que abandonam o Parlamento depois das últimas eleições legislativas: pelas ondas da rádio passaram José Manuel Pureza, Telmo Correia, António Filipe e Jorge Lacão.

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