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O Tribunal Constitucional (TC) anulou esta segunda-feira a decisão do PS de suspender os direitos do militante Manuel dos Santos de eleger e ser eleito durante dois anos, na sequência de ter chamado "cigana" a Luísa Salgueiro.
O antigo eurodeputado Manuel dos Santos recorreu para o TC da decisão da Comissão Nacional de Jurisdição do PS que transformou a expulsão de Manuel dos Santos numa suspensão dos direitos de eleger e ser eleito.
No acórdão, datado de 07 de junho, os juízes da terceira secção do Palácio Ratton decidiram "conceder provimento ao pedido formulado, anulando-se a decisão impugnada".
Os juízes alegam que "não foram ouvidas todas as testemunhas arroladas pelo arguido, o que sucedeu sem que este tivesse sido notificado, quer para se pronunciar sobre as incidências que conduziram a essa não audição, quer da decisão que nesse sentido foi proferida".
"Estando em causa a omissão de diligências essenciais a uma defesa adequada e, como tal, essenciais para a descoberta da verdade, e que não poderão ter-se como supríveis ou sanáveis, tais vícios procedimentais determinam a invalidade dos termos posteriores à apresentação da defesa do arguido no referido procedimento disciplinar", e "determina necessariamente a invalidade da decisão proferida pela Comissão Federativa de Jurisdição da Federação Distrital do Porto, bem como da decisão da ora impugnada, que devem ser anuladas", indicam ainda.
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Entre os juízes que assinam o acórdão está o presidente do TC, que apresentou uma declaração de voto na qual refere que votou "a decisão relativa ao processo em referência por entender que os vícios de que enferma o processo disciplinar instaurado ao recorrente, traduzindo sérias violações dos seus direitos de defesa, não permitiam outra decisão".
"Todavia, não ficaria de bem com a minha consciência se não assinalasse que o comportamento do arguido, cuja factualidade não foi posta em causa, foi reprovável e intolerável", indica também João Caupers, justificando que referir-se a Luísa Sagueiro como "cigana" "não pode deixar de consubstanciar um comportamento orientado para a humilhação e o achincalhamento da visada", apesar de ressalvar que não é censurável pertencer à etnia cigana.
O presidente do TC considera que a atitude de Manuel dos Santos perante a então candidata à Câmara Municipal de Matosinhos, atual presidente daquela autarquia, se trata "de evidente e chocante racismo, "temperado" com alguma discriminação de género, uma vez que a insultada é uma mulher e as mulheres ainda são uma minoria na política", conduta que defende não ser "aceitável, ainda por cima vinda de quem foi várias vezes deputado e exerceu relevantes cargos políticos e partidários".
Na semana passada, Manuel dos Santos disse à agência Lusa que o TC lhe deu razão neste caso, depois de em abril a Comissão Nacional de Jurisdição do PS ter dado "provimento parcial" a um recurso do histórico militante, expulso do PS em 2017 pela distrital do Porto, numa decisão que acabou por considerar "insuficiente" e que motivou o seu recurso para o TC.
"Por mim, do ponto de vista jurídico, não tenho nada a acrescentar. Se o TC tivesse mantido qualquer condenação, eu aceitava e demitia-me do PS. Assim, vou ver o que fazer, sem prejuízo de mais tarde ver se vale a pena continuar nesta luta. Embora hoje o partido que, hoje, chamo de 'Costista', não tenha nada a ver com o [Partido] Socialista,", disse Manuel dos Santos na altura.
Há menos de um ano, Manuel dos Santos recebeu ordem de expulsão por parte da Comissão de Jurisdição do Porto por ter chamado "cigana" à presidente da Câmara de Matosinhos, numa publicação feita no Twitter, em 2017, mas recorreu para o nível nacional do mesmo órgão partidário.
"Luísa Salgueiro, dita a cigana e não é só pelo aspeto, paga os favores que recebe com votos alinhados com os centralistas", escreveu Manuel dos Santos numa crítica aos deputados do círculo eleitoral do Porto que apoiaram a candidatura de Lisboa para sede da Agência Europeia do Medicamento.
Manuel dos Santos, no entanto, nega ter ofendido pessoalmente a atual autarca de Matosinhos e classificou o caso como "perseguição".