"Há urgências a recusar profilaxia pós-exposição." Governo promete levar medicamentos de prevenção do VIH aos centros de saúde

Após três anos sem sair, aí estão os números possíveis sobre o que fez o VIH por aí nos anos em que o mundo só pensou noutro vírus, no SARS-CoV-2. Há dados e denúncias que mostram como precisamos, ainda, de fazer muito melhor.

Logo no preâmbulo do relatório há o aviso de que, apesar da interrupção de dois anos, o documento que analisou as taxas de VIH e a incidência da SIDA no período da pandemia sai com falhas. O sistema informático onde se faziam as notificações de casos deixou de funcionar e por isso "não foi possível atingir numa proporção significativa de hospitais".

Mesmo com o risco de estar incompleto, o relatório mostra que foram diagnosticados, em 2020 e 2021, 1803 casos novos de infeção pelo VIH. Uma subida face a 2019, ano do último relatório, mas ainda assim a manter a tendência decrescente da década.

Sobressai no relatório a idade dos novos infetados: "63,6% tem entre 25 e 49 anos" e, além disso, os registos indicam que eram sobretudo homens que tinham sexo com homens.

Um dos dados mais inesperados é quantidade de pessoas que só foram diagnosticadas menos de um ano antes de morrerem, "19,8% dos óbitos ocorreram no primeiro ano após o diagnóstico". Mais uma vez, os novos infetados e homens que têm sexo com homens são os que mais pagam pelos diagnósticos tardios.

O relatório não aprofunda as causas, mas Kamal Mansinho, infeciologista, professor e diretor do Serviço de Doenças Infecciosas do Hospital Egas Moniz, em Lisboa, encontrou algumas pistas.

Avaliou as causas do diagnóstico tardio entre 260 doentes que seguiu entre 2006 e 2017 e a conclusão foi arrasadora: "Cerca de 36% dessas pessoas foram várias vezes atendidas em serviços do SNS; urgências, consultas de Infeciologia e outras especialidades, mas em nenhum momento lhes foi oferecida a possibilidade de fazerem um teste!"

"Há imensas pessoas que foram a serviços de urgência hospitalar pedir acesso a tratamentos de profilaxia pós-exposição", medicamentos que tomados durante algum tempo evitam a infeção por VIH e é pedida por pessoas que viveram situações passíveis de contágio, "mas foi-lhes negado".

O relato é de Ricardo Fernandes, presidente do European AIDS Treament Group, que apontou para a assistência no Instituto Ricardo Jorge, concretamente para representantes de associações de doentes, como a única resposta a estas pessoas, que é como quem diz quem lhes forneceu os medicamentos de profilaxia.

A partir do próximo ano "vamos tentar alargar as terapias de pré-exposição aos centros de saúde", prometeu no fim a secretária de estado da Promoção da Saúde, por sinal, a infeciologista Margarida Tavares.

O relatório deixa outros enigmas por esclarecer, por exemplo, por que motivo o concelho de Portimão, no Algarve tem um tão grande número de infeções, bem acima da média nacional ou por que razão subsiste uma espécie de discriminação do pessoal administrativo da saúde face a estes doentes. Pelo menos a julgar pelo testemunho do infeciologista Kamal Mansinho: "Há muita gente que reage como no início da doença. Há muita gente nos guichets para quem um doente com infeção VIH, esquálido e que chega ali a gritar, desperta imediatamente uma reação defensiva e a partir daí já não existe comunicação."

Tal como acontecia com quase todos quando se começou a falar de SIDA há quase 40 anos.

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