O Estado do Sítio

Num mundo em turbulência, as explicações para o estado do sítio, um olhar global e especializado para as histórias e protagonistas que marcam o nosso tempo. Um programa de Ricardo Alexandre e José Cutileiro.
Aos sábados, depois das 12h00, com repetição na madrugada de domingo, depois da 01h00.

"Europa Oxalá" desconstrói o pensamento colonial através da arte

A exposição "Europa Oxalá" está patente no Museu das Civilizações da Europa e do Mediterrâneo (mucem) em Marselha até domingo. São obras de 21 artistas e intelectuais europeus, cujas famílias têm origens das antigas colónias.

Ao todo são 21 artistas que nasceram e viveram em Angola, no Congo, no Benim, na Guiné, na Argélia ou em Madagáscar e herdaram memórias que chegam da família e de grupos de amigos e que não só são vozes, como sons e gestos, imagens e recordações das culturas de origem.

Estes são alguns dos pontos de partida para um trabalho de investigação nos arquivos históricos, familiares e institucionais. "Europa Oxalá" propõe uma reflexão sobre o racismo, a descolonização das artes ou a desconstrução do pensamento colonial.

"A posição dos governos tem sido, de alguma forma, a de silenciar um pouco o debate com um argumento, do meu ponto de vista, bastante frágil: enquanto não houver uma reclamação por parte dos governantes das ex-colónias, não vale a pena avançar por aí. No meu ponto de vista não faz sentido porque há um princípio de ética que está aqui subjacente a esta devolução", descreve o curador português da exposição, António Pinto Ribeiro.

Nos últimos anos, muitas estátuas com figuras do colonialismo ou do escravismo foram derrubadas ou destruídas na Europa e nos Estados Unidos. "Os monumentos são importantes para a reflexão do passado", defende o diretor do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra.

"Há quem avance muito, nomeadamente os ativistas mais radicais, para a ideia de destruição das estátuas. Não é essa a minha posição porque acho que as estátuas não devem ser derrubadas. Há muitas formas de desconstruir o poder imagético que é; ou fazer "isto", que são os desenhos, ou legendar as obras. Por exemplo, o Leopoldo II foi um imperador, mas também o maior genocida europeu em África - aí o comentário à estátua fica claro. Esta é a forma mais inteligente, interessante, socialmente impactante de desvendar a figura deste tipo de personagem", explica.

Nas últimas duas décadas surgiu "uma nova massa crítica de origem na África do Sul, na Nigéria, em Marrocos, no Egito e noutros países africanos", que abriam um novo discurso colonial. "Vieram com uma grande solidez argumentativa e teórica, conseguindo impor-se e descontrair todo esse discurso colonial", descreve António Pinto Ribeiro.

António Pinto Ribeiro acredita que é necessária uma "desconstrução no ensino e na comunicação social", na procura de uma dimensão "mais inteligente e humana sobre o passado, para desconstruir esse pensamento colonial".

O chefe de Estado francês, Emmanuel Macron, tem sido pioneiro nesta abertura da França nas relações com os países africanos. Emmanuel Macron "foi pioneiro num conjunto de debates que se iniciaram e tem convidado personagens fantásticas, filósofos africanos, estudantes e professores da história argelina", lembra o curador da exposição.

A devolução das obras de arte ao Benim chamou a atenção aos museus "para que eles reflitam de outra maneira. O Presidente francês também faz parte de uma geração que não fez a guerra da Argélia e, portanto, não tem qualquer tipo de nostalgia colonial".

Percorremos o trabalho dos artistas da pós-memória colonial na exposição "Europa Oxalá" com o curador português António Pinto Ribeiro. Uma mostra que convida à reflexão da noção de Europa e da sua relação com o mundo. A exposição "Europa Oxalá" estará em Lisboa a 4 de Março, na Fundação Calouste Gulbenkian.

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