Aparentemente, não há qualquer ligação entre o reaparecimento do cágado-mediterrânico, há duas semanas, no rio Sousa, em Gondomar, e a intensidade carbónica provocada por jactos privados no percurso entre Lisboa e Tires.

O cágado-mediterrânico da espécie mauremys leprosa, agora reavistado, depois de quatro anos de ausência ao longo dos cinquenta quilómetros do Sousa, aparece descrito em recantos digitais dedicados à biodiversidade. Esses, como sabemos, são lugares onde dificilmente encontraremos os jactos privados que, em 118 voos realizados o ano passado para cumprir os 20 quilómetros e 370 metros do percurso entre Lisboa em Tires - a mais curta rota aérea portuguesa - produziram 108 quilos de dióxido de carbono.

A Greenpeace acaba de revelar que a rota Lisboa-Tires em jacto privado foi, o ano passado, a segunda com maior intensidade carbónica na Europa.

O cágado-mediterrânico agora reavistado no Sousa, cujo percurso é pouco mais de duas vezes maior que o necessário para ligar Lisboa a Tires, hiberna nos invernos mais frios, ao contrário dos jactos privados. Há cágados-mediterrânicos com fartura, nos charcos, rios e riachos de norte a sul, embora mais no interior. Já os jactos privados farejam preferencialmente o ar das zonas litorais.

Nos últimos quatro anos, foi avistado um cágado-mediterrânico nas águas do Sousa. Só no ano passado foram detectados 118 jactos privados no percurso Lisboa-Tires.

Um provérbio umbundo avisa-nos: "se virmos um cágado em cima de uma árvore, é porque alguém o pôs lá". Não há registo de jactos privados em cima de árvores, salvo pelos piores motivos.

Sem querer forçar ligações, este aumento de voos de jacto privado (com as correspondentes malfeitorias ambientais) fez-me recordar uma tirada que ouvimos mais do que uma vez a Jerónimo de Sousa: "o grande capital vai passando graxa ao cágado". Não por acaso, o investigador que confirmou o regresso do cágado-mediterrânico ao Sousa alertou para a presença crescente do cágado-da-Flórida, uma espécie invasora. Terá vindo de jacto?