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A situação de seca que se vive um pouco por todo o mundo e que leva diversos países, como Portugal, a um maior recurso às energias fósseis, contribuindo para o aumento das emissões de gases de efeito de estufa, bem como a guerra na Ucrânia conduziram à crise energética que a Europa hoje vive. Devido à ameaça do corte de fornecimento de gás russo e consequente aumento de preços, a Comissão Europeia já definiu metas de poupança, principalmente, no que diz respeito ao gás natural.
Francisco Ferreira, da associação ambientalista Zero, recorda que a Comissão Europeia negociou com os Estados-membros "objetivos de corte no uso de gás natural na ordem dos 15%, com algumas exceções como é o caso de Portugal, onde a dependência russa é menor e, como estamos muito longe e quase que numa ilha em termos de interconexão à escala europeia, ficamos pelos 7%".
"Mas o importante aqui é realmente esta urgência energética em que cada um dos Estados-membros da UE tem que apresentar e concretizar um plano de poupança de energia imediato, mas que também se espera que no médio e longo prazo se venha a traduzir num maior uso de renováveis e numa maior eficiência energética", explica.
Ouça aqui o Verdes Hábitos sobre os impactos ambientais do uso de energia. Um trabalho com sonoplastia de Mariana Sousa Aguiar
Quais os impactos ambientais do uso de energia?
Francisco Ferreira afirma que, tendo em conta as metas climáticas e a dependência europeia no que respeita aos combustíveis fósseis, tanto o uso de carvão, como de petróleo e gás natural, têm implicações nas alterações climáticas, no aquecimento global e na qualidade do ar.
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Por isso, "há vários desafios": "Usar as circunstâncias para conseguirmos poupar muita energia que é desperdiçada e virarmos a agulha dos combustíveis fósseis para as energias renováveis. Reduzirmos o forte impacto ambiental que estes combustíveis tradicionais têm."
Para o especialista, "reduzirmos consumo de energia é a forma mais barata de agirmos e por isso é que é tão importante apostarmos nesta redução de consumo e nas medidas de eficiência energética".
"Se nós conseguirmos garantir o mesmo conforto e o mesmo nível de atividade económica através destes cortes, nós impactamos muito menos o ambiente, reduzimos a nossa contribuição para as alterações climáticas e para a degradação da qualidade do ar. Além disso, tornamo-nos mais resilientes, porque se precisarmos de menos energia e começarmos a produzir energia a partir de fontes renováveis, tornamo-nos independentes de muitas fontes e pontos de conflito. Produzir localmente e necessitar de produzir menos para evitar o desperdício é o lema", sustenta.
Poupança energética: o que está a ser feito na Europa e o que falta em Portugal?
Há já vários países da União Europeia que estão a apresentar planos de poupança para evitar a escassez no inverno, como Espanha, Alemanha, Suíça, Irlanda ou Grécia. Francisco Ferreira destaca que há medidas "muito importantes que alguns países já tinham englobado no seu próprio Plano de Recuperação e Resiliência, ainda anterior à invasão da Ucrânia pela Rússia, e que são medidas estruturantes no edificado", como a eficiência energética.
Ainda assim, há outras medidas "prioritárias" relativas ao conforto térmico, tais como "não cometermos abusos no que respeita à temperatura que temos em casa". "Não nos esqueçamos que muitos dos países do Norte da Europa fazem muito uso, mesmo com o isolamento das casas, de combustíveis fósseis para garantir temperaturas elevadas dentro de casa e as medidas dizem respeito a isso, ou seja, nós conseguirmos viver com conforto, mas com temperaturas menores."

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Em Portugal nem sempre há esta preocupação, porque "o nosso conforto fica muito aquém do que seria desejável". "À custa do vento que nos entra pela janelas ou pelas frestas da porta ou pela qualidade de construção de nossa casa, já estamos habituados a precisar de umas mantas ou de não esticarmos o aquecimento ineficiente que temos em casa por causa de não dispararmos os preços", considera Francisco Ferreira.
O especialista defende que, em Portugal, as medidas que irão necessitar de maior investimento dizem respeito à habitação, nomeadamente, na "construção de habitação digna e exigente do ponto de vista da sua certificação energética, da sua qualidade de construção e quantidade de energia necessária para garantir esse conforto".
"São milhões, milhões e milhões que estão aqui em jogo, mas é aí que está a grande fatia do investimento e, mesmo assim, vamos ficar muito aquém daquilo que é necessário para nós reduzirmos as nossas necessidades de energia e vivermos, quer no verão, quer no inverno, de forma confortável nas nossas casas", refere.
Comércio, serviços e transportes
Francisco Ferreira enumera diversas medidas que devem ser implementadas pelo setor do comércio e serviços com o objetivo de poupar energia: "Adequação das temperaturas usadas no interior, nos 25 ou 26 graus no verão e nos 18 ou 19 graus durante o inverno, e a climatização ativa."
"No comércio e serviços parece-nos que isso é possível com alguns cuidados, com mudanças de comportamento no dia a dia", diz.
Já nos transportes, um setor que a Zero defende que tenha cada vez mais investimento, Francisco Ferreira sublinha que "dizem respeito a todos nós, mas também às empresas, que são muito culpadas". Isto porque "algumas delas oferecem o gasóleo ou gasolina e oferecem o automóvel, em vez de fomentarem o uso do transporte público".
"Infelizmente, temos uma rede de transportes públicos que tem estado com alguns problemas, nomeadamente, no que diz respeito ao transporte rodoviário coletivo, algumas das mais recentes transformações não têm estado a correr como seria desejável, mas isso não significa que eu não tenha uma enorme margem de, mesmo utilizando o carro num bocadinho no meu percurso, não possa depois fazer uma utilização muito extensa do transporte público, com uma poupança enorme em termos de gasóleo e gasolina", aconselha.
O que fazer para poupar energia no dia a dia?
Francisco Ferreira assinala que "a grande oportunidade era apostar na reabilitação de edifícios sem necessidade de recurso a climatização ativa", algo que não será fácil por estarmos também a viver uma crise económica. No entanto, o especialista avança que há atitudes que podem ser tomadas no imediato, como a calafetagem, "ou seja, melhorar o isolamento, impedindo as trocas de calor através das brechas das janelas e das portas".
A utilização de água quente solar é mais uma possibilidade, apesar de ser um investimento "na ordem dos dois mil ou 2500 euros". "O Fundo Ambiental tem tido programas de apoio aos edifícios mais sustentáveis", frisa, reconhecendo ainda a importância que deve ser dada à pobreza energética.
A colocação de painéis solares "não só para a água quente, mas também para a produção de energia elétrica, se houver possibilidade", e o menor uso do automóvel são outras medidas que podem ser aplicadas no dia a dia tendo em vista a poupança energética.
No site oficial da associação ambientalista Zero, há ainda outras soluções: "Evitar guardar alimentos quentes no frigorífico ou na arca congeladora, porque isto irá refletir num maior trabalho do equipamento para os arrefecer, tomar duches mais curtos permite não apenas poupar energia ao agregado, pois terá de aquecer menos água, como terá menos custos energéticos relacionados com o tratamento e transporte da própria água até às nossas casas. Além da poupança hídrica, já que estamos a passar por uma seca severa em território nacional."