Primeiro foi preciso identificar o mecanismo que resulta nas falhas de memória dos doentes de Parkinson, e a equipa de investigadores do Instituto de Medicina Molecular de Lisboa e das universidades Nova de Lisboa e de Goettingen, na Alemanha concluiu que o processo consiste em vários passos.
O jornalista Hugo Neutel conversou com Tiago Outeiro, um português envolvido na descoberta
Primeiro, é preciso que, tal como sempre acontece nos doentes de Parkinson, exista acumulação de uma proteína - a alfa-sinucleína - com comportamento anormal.
Depois, uma outra proteína - a PRP - funciona como uma espécie de radar que deteta a acumulação da primeira, e envia essa informação aos neurónios.
Os neurónios recebem essa informação através de recetores específicos - designados A2A - e isso provoca alterações nas funções ligadas à memória.
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Tiago Outeiro, diretor do Departamento de Neurodegeneração Experimental da Universidade de Goetingen na Alemanha, e líder de um grupo de investigação no Centro de Estudos de Doenças Crónicas da Universidade Nova de Lisboa, explica que "esta proteína [a alfa-sinucleína] interage com outra proteína [a PRP] que funciona como um sensor ou radar, percebe que a proteína está a comportar-se de forma nociva e transmite essa informação aos neurónios, desencadeando processos que levam à disfunção neuronal que está por detrás destes processos cognitivos"
Explicado o processo, era preciso criar formas de reproduzir em laboratório e tentar impedi-lo. Em ratinhos de laboratório que receberam um fármaco inspirado na cafeína verificou-se que a presença do químico inviabiliza o processo: impede os tais recetores A2A de transmitirem a informação avançada pelas PRP aos neurónios, ou seja: as alfa-sinucleínas deixam de ter efeitos nocivos.
"Essas moléculas impediram que o sinal do radar fosse transmitido para dentro das células", explica Tiago Outeiro, acrescentando que dessa forma elas "continuam a funcionar de forma saudável".
Esta é uma investigação de ciência fundamental, pelo que não se poderá esperar, no imediato, resultados práticos. Ainda assim, explica Tiago Outeiro, o estudo "abre muitas portas ao nível deste tipo de sintomas da doença de Parkinson, porque até aqui estávamos muito limitados aos sintomas motores".
"O que há a fazer é continuar, aprofundar o estudo, testar outras moléculas, outros fármacos no sentido de tentarmos um dia chegar a algo que possa ser utilizado nos doentes", assegura o investigador.
O estudo, da autoria de Outeiro e de Luísa Lopes, do Instituto de Medicina Molecular de Lisboa, foi publicado na revista Nature Neuroscience.